sábado, 27 de dezembro de 2008

Feminina – 27/12/2008


Camisinha feminina. Esse é o tema que me traz a Washington, como ativista do movimento de luta contra a Aids. Na verdade, não é privilégio do Brasil a preocupação em buscar novas formas de prevenção, e a camisinha feminina é uma delas. Representantes de diversos setores ligados ao planejamento familiar, a luta contra a Aids e a busca de novas opções se reuniram para traçar estratégias que ampliem o seu oferecimento à população, como alternativa ao nosso velho conhecido "male condom".
O preservativo feminino começou a ser distribuído no Brasil em 2006, mas desde 1999 o governo, através do Programa Nacional de DST-Aids, vinha promovendo estudos que comprovassem sua viabilidade, o que resultou numa primeira compra de 2 milhões de unidades. Esse número vem crescendo, acompanhando a aceitação do produto, e para 2009 o Brasil adquiriu 7 milhões de unidades que serão distribuídas prioritariamente entre as prostitutas e outros grupos de mulheres com vulnerabilidade acrescida.
A camisinha feminina é cara se comparada com a masculina. A primeira geração do produto, que vinha sendo distribuída até esse ano, apresentava alguns problemas, como um barulho inconveniente durante as relações, além de esteticamente desagradar a ambos os parceiros. Entretanto, as vantagens compensam: aumenta o poder de negociação das mulheres em relação ao sexo seguro, uma vez que coloca em suas mãos, literalmente, a decisão de se proteger, o que tem sido um ponto forte na adoção do insumo em nosso país machista. Grande parte dos problemas porém estão resolvidos com a segunda geração do produto. O material foi modificado, acabando com o barulho desagradável, mas ainda nos deparamos com um custo bastante elevado, se comparado com as masculinas – cerca de R$ 14 (embalagem com duas) ao passo que as masculinas chegam a custar R$ 1,50, três unidades.
O mais importante disso tudo, porém, é que as políticas públicas de prevenção às doenças sexualmente transmissíveis baseadas no uso do preservativo estão vencendo. Durante esse encontro aqui nos EUA, ficou evidente que o mundo inteiro deposita no presidente eleito Barack Obama a esperança do fim de uma era puritana e hipócrita que insistia em negar a realidade sexual das pessoas. O Brasil mostrou que isso não funciona e apresentou sua resposta à epidemia, cuja prevenção tem como pilar fundamental a adoção dos preservativos.
Mais uma vez, porém, está nas mãos da sociedade civil promover essa mudança, acabar com os preconceitos e fazer com que a camisinha feminina chegue a quem de fato necessita, comprovando que nosso programa de Aids não é considerado um modelo para outros países à toa. É o que o mundo espera de nós.
Camisinha sempre!

sábado, 13 de dezembro de 2008

Fim de Ano – 13/12/2008



Para muitos casais gays, final de ano é sinônimo de problemas. As árvores de Natal que enfeitam nossas reuniões de família ainda são decoradas com indiscrições, censuras, homofobia. É época de decisões importantes e radicais, confrontos, posicionamentos que provocam avaliações do que aconteceu durante todo o ano, senão durante toda a vida. Época em que muitos casais homossexuais solidificam o seu amor ou se deixam fraquejar diante das pressões familiares.

Final de ano convida a sair do armário. Emoções à flor da pele, corações abertos, muitas vezes revelam que chegou a hora de contar para quem a gente ama nossos segredos. É quando se agiganta essa necessidade incontida de ser mais verdadeiro, de deixar o escuro e buscar a luz, de se expor de dia, respirando fundo um sentimento que somente quem passou anos de sua vida negando sua identidade conhece. É o alívio do resgate de nós mesmos.

Natal em família é coisa de brasileiro. Parentes distantes, pessoas que não se vêem há muito tempo, convidados especiais. Um reencontro intenso que nos obriga a reconhecer velhos conhecidos. Novos pontos de vista de antigos personagens que carregam na bagagem da saudade histórias, dores e alegrias cotidianas. Na intimidade crua do convívio repentino e emotivo do final de ano, revelam-se surpresas boas e ruins. São expectativas que muitas vezes se frustram diante de um comentário na hora errada, uma saia-justa, um deboche, um veneno.

Festas de final de ano servem para nos lembrar o quanto amamos e somos amados por nossos parentes e o pouco que nos dedicamos a eles. Mas também nos trazem reencontros que preferiríamos dispensar e situações embaraçosas que poderiam ser perfeitamente evitadas. Assim, é nessa ocasião que se afloram as críticas, os preconceitos e a franqueza que agride e machuca. Todo gay tem uma história triste de fim de ano para contar.

São inúmeras as famílias que não aceitam nossas famílias gays. Quantos casais homossexuais passam seus natais separados como alternativa para poderem estar ao lado de pais, irmãos, sobrinhos. Quantas vezes já nos vimos na tenebrosa e novelesca situação de optar: "ou ele ou eu", divididos entre dois amores que resistem em se relacionar.

Final de ano é referência de tempo. E o mesmo tempo que machuca cura as feridas. Haverá um dia em que não precisaremos lutar para sermos aceitos como uma família. Diferente, mas que também monta sua árvore de Natal e se emociona com as mensagens de final de ano.

Camisinha sempre!


sábado, 6 de dezembro de 2008

Divisão – 06/12/2008



Existe um movimento LGBT no Brasil que se organiza, alcança a mídia de massa e tem suas vitórias e derrotas pautadas pelos principais jornais do mundo. São notícias que chegam à população às vezes como fatos bizarros, rebeldias inconseqüentes, afronta aos costumes, ou outras como um reflexo evolutivo do respeito à diversidade. Poucas vezes, entretanto, o movimento LGBT está na mídia como uma força política que disputa espaços (ou uma arena onde forças políticas disputam espaços). O jogo político do nosso movimento, apesar das disputas acirradas, não alcança – ou não interessa ao cidadão comum, não-LGBT. Muitas vezes não interessa nem aos próprios homossexuais.
Mas, ele existe e o nível das rusgas internas – que se concretiza na conquista de cargos e representações – chega a situações extremas que desafiam a ética e o interesse coletivo. Muitas vezes, o objetivo se resume ao acesso privilegiado às informações, à participação nos processos de decisão que, na verdade, facilitarão o caminho aos recursos orçamentários governamentais destinados à população LGBT. Recursos pífios, se avaliada a nossa participação no orçamento global, mas significativos quando vistos sob o prisma das organizações que estabelecem convênios e executam o que caberia ao governo. Migalhas que têm nos mantido sob controle e levado à desunião, dividindo-nos entre os que se submetem e os que não; entre os que se calam e os que gritam.
 
O retrato disso pode ser visto no 13º Encontro Brasileiro LGBT, realizado em Porto Alegre, entre os dias 28 e 30 de novembro, quando se reuniram associações e redes nacionais, além de representantes das ONG e militantes autônomos interessados nessa luta. O próprio Encontro esteve em questão: de um lado, vitoriosos na votação final, os que o consideram ultrapassado para ser um momento de deliberação do movimento e que atribuem esse poder aos encontros específicos das redes e associações nacionais independentes. Perderam aqueles que defendiam o Encontro como o momento legítimo de convergência de idéias e base para as ações das redes nacionais e suas especificidades.
 
Lésbicas, travestis e transexuais há anos já realizam seus próprios encontros e possuem suas instâncias de decisão. Homens gays estarão se reunindo pela primeira vez em 2009, puxados pela Abragay, o que deverá reforçar essa tendência e pulverizar ainda mais um movimento já tão pouco solidificado. 

Como pano de fundo, percebe-se uma tentativa clara de se atrelar o movimento LGBT ao controle de partidos políticos. O resultado já pode ser visto: em Porto Alegre ficou patente a divisão de um movimento que ainda possui aqueles que assumem um silêncio comprometido em troca de apoio para precários financiamentos de projetos.
 
Camisinha sempre! 

sábado, 29 de novembro de 2008

União estável – 29/11/2008



Nessa semana, militantes do movimento LGBT de todo o Brasil se reuniram em Brasília para participar do II Seminário do Projeto Aliadas da ABGLT – Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais e do V Seminário Nacional LGBT, no Congresso Nacional.

Diferente do anterior, o seminário aconteceu dessa vez no Senado, um dos ícones do conservadorismo do país, onde tramita a passos lentos o PLC 122/06, que tenta aprovar a criminalização da homofobia em solo brasileiro.

Apesar da importância de aprovarmos uma lei que puna o preconceito homofóbico com o mesmo rigor que punimos o racismo, por exemplo, volta à cena com bastante ênfase a discussão sobre a união entre pessoas do mesmo sexo, ainda tão polêmica e renegada nas nossas casas legislativas: desde 1995 que tramita pelos corredores do Congresso Nacional o projeto da então deputada Marta Suplicy que garante aos casais do mesmo sexo o reconhecimento de sua condição de família e os direitos e deveres advindos disso.

Nos três dias de discussão não faltaram propostas e argumentos que impeliam a novas estratégias e um posicionamento unificado de todo o movimento e da Frente Parlamentar pela Cidadania LGBT. O assunto vem sendo retomado pelas lideranças, e operadores do direito ligados ao movimento e levam em consideração os avanços ocorridos nesses 13 anos de tramitação do PLC 1151.

Hoje, pelo menos cinco países já reconhecem os direitos dos casais do mesmo sexo em toda sua plenitude. Exatamente os mesmo direitos dos casais heterossexuais, incluindo garantias patrimoniais, previdenciárias, sucessórias, de adoção e guarda de filhos, atenção e cuidados entre as partes.

Como resultado, o movimento LGBT se uniu em torno de uma proposta de substitutivo ao projeto original que estende o entendimento de união estável, já prevista e regulamentada em nossos estatutos, às pessoas do mesmo sexo. Assim, optou-se por acrescentar um artigo ao Código Civil que aplique aos casais homossexuais as mesmas regras definidas para as uniões estáveis.

Isso, aliás, já vem sendo garantido pelo Judiciário há anos, como no caso do INSS, onde os homossexuais viúvos têm reconhecido o direito à pensão do companheiro. Depois de 20 anos de Constituição, os homossexuais ainda não são reconhecido como cidadãos. O Congresso Nacional nos deve uma lei que reconheça nossa cidadania e que faça com que não nos sejam negados os direitos conquistados por todos os brasileiros.

Camisinha sempre!

sábado, 22 de novembro de 2008

Brigas – 22/11/2008



A primeira vez a gente nunca esquece. O menino se chamava Ivair e insistia em me aporrinhar. Na verdade, ele me incomodava porque me denunciava. Eu era gay e sabia que era, mas não queria ser. Lutava arduamente para não parecer: naquela idade parecer era mais importante que ser.

Pois o Ivair ficava me enchendo. Ficava me imitando, caricaturando meus gestos infantis – ou afeminados – de garoto de 10, 11 anos, me chamando de bichinha e me passando a mão. Acho que todo gay já passou por isso e guarda na memória o sabor degradante que tem a exposição pública de suas particularidades, o questionamento da sua masculinidade, num momento de vida em que nem a gente mesmo entende direito o que é ser homem.

Meninos não merecem esse sentimento. É o momento em que estamos colocando os pés na rua. Não sabemos direito como as ameaças machucam, fora das asas do nosso lar. Nosso pequeno repertório de comportamento ainda se restringe à avaliação passional e parcial de pais, irmãos, primos. Até que, um belo dia, o nosso mundo cresce com a rua, e o menino-homem encara os desafios. Homens-meninos tão frágeis, tão virgens, tão inocentes que a violência da chacota ali, na roda de moleques, toma proporções que deixam marcas para o resto da vida.

O Ivair, entretanto, não era o único. Era só o menor. Tinha também o Mico, que gostava de bater, apertar, imobilizar. Mais forte que eu, fazia com que me sentisse covarde, menos macho ao evitar seus desafios. E aquele mal-estar crescia, os apelidos surgiam e a verdade se transformava em um monstro dividindo comigo o travesseiro molhado. Para virar homem teria que mentir, fingir, deixar de ser e parecer gay. Aprender a linguagem da rua, o rosnar, o bater, o ladrar. Era o que se esperava do menino que reivindicava o direito de ser livre, de ganhar o mundo e fazer amigos.

Uma vez, na esquina onde nos reuníamos todas as noites para conversar, brincar e aprender o que não se ensinava em casa, o Ivair e o Mico vêm de novo com aquela conversa de veadinho, bichinha e passa a mão dali e esfrega daqui. Decidido, resolvi colocar um fim no tormento e revidei. Minha primeira briga de rua. Como um cachorro bravo, parti para cima do Ivair, chorando, furioso, sem técnica, sem malícia, só com raiva. Engalfinhamos-nos no chão, puxei seus cabelos, mordi, chutei, unhei e chorei.

Entre suspiros e arranhões fui para casa, para o meu quarto, e deixei que as lágrimas fluíssem mais uma vez, quentes, no meu travesseiro, companheiro de tantas solidões. Trancava-me assim num armário que só viria a ser aberto muitos anos mais tarde, quando entendi o que significa ser gay e decidi usar outras armas para lutar por respeito.


Camisinha sempre!

sábado, 15 de novembro de 2008

Humanos – 15/11/2008


O preconceito tem maneiras peculiares de se manifestar. Uma delas se revela nos apelidos, na linguagem popular, nas gírias e palavrões. É comum grupos discriminados serem retirados da condição de humanos e reduzidos a animais: mulheres a piranhas; negros a macacos, gays a veados.

Esse processo, entretanto, vai além. Aos gays são atribuídas outras características que nos diferenciam do que é ser gente. Até mesmo em situações positivas, mas que alimentam um mito que nos circunda e que nos distancia das pessoas "normais". Assim, é comum ouvirmos generalizações falsas como: "Vocês gays são inteligentíssimos! Talentosíssimos! Habilidosíssimos!" que nos reduzem a uma massa homogênea e reforçam a distância que existe entre eles e nós, entre o padrão e o diferente.
Existem também os que nos entendem como seres puramente sexuais, máquinas movidas a testosterona, que pensam e vivem sexo 24 horas por dia.

Assim, se esquecem que um olhar não significa necessariamente um flerte e que um tratamento cordial pode não ser exatamente uma cantada. E mais: que um gay num banheiro público pode sim significar simplesmente alguém que foi ali fazer xixi. Temerosos – e inseguros – existem homens que ainda acreditam que correm sérios riscos ao dividir espaços conosco, como banheiros públicos, vestiários, barracas de camping, ou quartos de hotel. Conheço empresas que colocam seus funcionários gays em quartos individuais "para evitar constrangimentos". E colegas de trabalho que se recusam a dormir ao nosso lado, como se – pretensiosos! – o assédio fosse inevitável.

Combater a homofobia é também resgatar a nossa condição de humanos. Quanto mais nos emancipamos e nos incluímos, mais e mais situações de divisão de espaço entre heteros e gays vão surgindo, mostrando que nem todos estão preparados para conviver com as diferenças.

Estou participando da III Teia, em Brasília, evento que reúne cerca de 2 mil representantes de mais de 800 Pontos de Cultura, pessoas vindas de todos os cantos e que revelam a diversidade cultural brasileira. Nesse ambiente, cujo slogan é "Iguais na Diferença", depois de muitos anos, volto a sentir o gosto amargo de ser discriminado por um companheiro, artista, que se incomodou em dividir um quarto comigo e mais um colega.

Nessas minhas andanças, já partilhei acomodações com jovens e velhos, com brancos e negros, ricos e pobres, ateus, padres e pastores. Nunca tive um problema sequer e sempre fiz boas amizades nessas situações. Talvez, por não ter dificuldade nenhuma em ser humano, em ser eu mesmo.

Camisinha sempre!


sábado, 8 de novembro de 2008

O novo – 08/11/2008



Os ares que sopram do norte chegam ao hemisfério sul: Barack Obama é o novo, o primeiro, o pioneiro presidente dos Estados Unidos da América. Representa o resgate do sonho norte-americano de prosperidade e mobilidade social. Um presidente que chega exatamente num momento em que o mundo inteiro se movimenta para sobreviver a uma crise provocada pelo capitalismo norte-americano e que, mais uma vez, parece sair fortalecido. Apesar de tudo, a vitória de um cidadão negro para a Casa Branca alimenta a ilusão de ascensão social e surge como a panacéia que irá resolver todos os problemas do mundo, até mesmo o racismo que permeia a história daquele país.

No mesmo dia 4 de novembro, enquanto elegiam seu presidente democrata – que não se esqueceu de agradecer aos gays em seu discurso da vitória -, os cidadãos da Califórnia aprovaram por 52,5% a 47,5% a Proposição 8, que modifica sua Constituição e restringe o reconhecimento do Estado aos casamentos entre um homem e uma mulher. Por trás disso está uma campanha milionária patrocinada por grupos religiosos e o apoio maciço dos homens e mulheres negros: 75% deles votaram contra os gays.

Obama esteve ao nosso lado em relação à Proposição 8. Ele defende que não cabe ao Estado interferir na forma como se darão os casamentos: isso é um problema das igrejas. Para ele, cabe ao Estado garantir os mesmos direitos a todos os casais, sejam gays ou não.

Nesse curto período em que vigorou na Califórnia – desde maio de 2008, quando a Suprema Corte decidiu permitir a união civil entre homossexuais -, 18 mil casais oficializaram sua relação, numa surpreendente média de 3.000 por mês. Agora, enquanto grupos militantes entram na Justiça contra a emenda à Constituição que restringe seus direitos, em Los Angeles e São Francisco milhares de pessoas saem às ruas em protesto contra a decisão, revivendo tempos de confronto com a polícia, corre-corre e prisões.

A derrota dos gays na Califórnia mostra que nem todos os norte-americanos se sentem corajosos o suficiente para apostar no novo e o quanto é mais difícil vencer a homofobia. A grandiosa vitória de Obama, por sua vez, revela que estamos mais fortes que eles e que, apesar dos conservadores da Califórnia, estamos diante de um importante avanço na luta contra o preconceito e pela igualdade de direitos.


Camisinha sempre!

sábado, 1 de novembro de 2008

Duas Leis – 01/11/2008


Apesar de o assunto homossexualidade ter roubado novamente a cena das eleições em várias cidades e o preconceito contra gays, lésbicas e travestis ter sido usado e abusado como estratégia de enfraquecimento de adversários, não tive notícias de uma condenação sequer por calúnia, difamação ou violação da Constituição brasileira. Não existe lei que criminalize a homofobia nesse país. Enfim, as eleições passaram e, ainda bem, as regras que prevalecem no período eleitoral não são aquelas que orientam o nosso cotidiano. A homofobia desconhece as regras e o calendário eleitoral e não nos deu folga.

Tenho ouvido e lido coisas tão absurdas que vão desde a responsabilização da homossexualidade ao consumo de soja, até um advogado de Juiz de Fora defendendo publicamente seu direito de não querer alguém que ele “não goste” ao seu lado na rua – um gay, por exemplo: “Tal comportamento deveria se circunscrever à intimidade do lar ou a lugares reservados”, decretou. Tal pensamento também.

Entre um susto e outro, essa semana nos defrontamos com o parecer de um promotor público bahiano dizendo que "a homossexualidade é altamente incompatível com o serviço militar" e outras barbaridades. Enquanto isso, o Rio escapou por pouco: Sérgio Cabral mandou rever a decisão da PM de lá que negava a pensão a um outro soldado viúvo e garantiu o cumprimento da lei carioca que assegura esse direito aos servidores públicos do estado. 

Em São Paulo, alunos gays da USP foram expulsos de uma festa do Centro Acadêmico porque se beijaram, enquanto cresce a lista do Prof. Mott que beira os 200 assassinatos por homofobia no Brasil em 2008. Já nem causam assim tanto furor, apesar da crueldade dos casos.

Não acredito em retrocesso, numa volta ao conservadorismo puritano. Acredito que todos esses acontecimentos são sintomas da urgência de aprovarmos a união civil entre pessoas do mesmo sexo e o PLC-122 que criminaliza a homofobia. A união civil, que encontra-se arquivada no Congresso após tramitar desde 1995, precisa ganhar nova redação, menos restritiva e patrimonialista. O projeto de criminalização da homofobia, que se tornou o alvo principal dos ataques dos religiosos que insistem em negar a proteção ao cidadão vítima de preconceito, precisa parar de vagar pelas comissões do Senado e ser colocado em votação.

Está passando a hora de aprovarmos leis que assegurem direitos às famílias homossexuais e a punição daqueles que se consideram acima do respeito à dignidade do outro.

Camisinha sempre!  


sábado, 25 de outubro de 2008

Prevenção – 25/10/2008



Estamos diante de mais um novo desafio: descobrir outros modelos de prevenção à Aids e às doenças sexualmente transmissíveis (DST) que tragam melhores resultados. Foi com essa proposta que o Ministério da Saúde reuniu essa semana em Brasília os membros da sua Comissão Nacional para ampliar os debates sobre novas e eficientes ferramentas e ações de prevenção às DST-Aids.

O tema é providencial, uma vez que o Brasil ainda possui uma epidemia concentrada, com prevalência alta em alguns grupos específicos, submetidos às mais diversas vulnerabilidades. Entre estes, as trabalhadoras e os trabalhadores sexuais, os usuários de drogas, os gays, as travestis e transexuais. É urgente, portanto, se pensar em estratégias eficazes que considerem novas dimensões da prevenção e que avancem além do binômio informação-insumo, adotado desde o início da epidemia: e tome palestra, folheto e camisinha.

A prevenção à AIDS precisa ir para além do preservativo. Assim como são oferecidas aos casais várias ferramentas de contracepção, e cabe a eles escolherem aquela que melhor vá se adequar às suas características – sua forma de se relacionar sexualmente, suas predileções e seu planejamento familiar –, os cidadãos e cidadãs brasileiros precisam ter opções de prevenção. Nesse sentido, surge nos congressos e encontros internacionais uma tendência à medicalização da prevenção, tendo como carro-chefe a circuncisão, os microbicidas e as pílulas: da véspera ou do dia seguinte.

Os estudos sobre a circuncisão, já referendados pela ONU e pela OMS, apontam para uma diminuição do risco de infecção da ordem de 60% em homens circuncidados heterossexuais. Apesar disso, não está nos planos do Ministério da Saúde, ampliar o oferecimento de cirurgias de retirada do prepúcio nos homens e muito menos apresentar esse procedimento como substituto ao preservativo. A redução de 60% não significa que o risco deixe de existir para os circuncidados e os estudos por enquanto se restringiram às relações heterossexuais, ou seja, transmissão da mulher para o homem.

Enfim, tudo aponta para a pluralidade, em que o discurso único do uso da camisinha dê lugar a um rol de opções mais democráticas e também eficientes. O discurso repetitivo do uso do preservativo tem perdido força e as relações desprotegidas estão crescendo. Está claro que não poderemos ficar eternamente apregoando o uso da camisinha, distribuindo gratuitamente, incentivando os cuidadosos e condenando aqueles que não se adaptam ao insumo. Os índices de pessoas infectadas não param de crescer e é importante que surjam novos caminhos agora, antes que mudem as características da nossa epidemia.


Até lá, não nos restam muitas alternativas: o uso do preservativo é a única forma eficaz de se prevenir contra o HIV. Portanto, camisinha ainda!

sábado, 18 de outubro de 2008

Medíocres – 18/10/2008



O que possuem em comum o deputado gay paulista Clodovil Hernandes, a vereadora transgênero baiana Léo Kret e o vereador hetero juizforano Tico-tico? 

Primeiramente, todos esses personagens foram eleitos legitimamente, representam um grupo de cidadãos e cidadãs que votaram neles e é assim que a democracia funciona. Clodovil representa as velhinhas paulistanas que assistem a seus programas vespertinos; Léo Kret os humildes, os desiludidos, os desprovidos de recursos, que disputam de forma selvagem as migalhas que a sociedade lhes reserva e que acreditam no escracho como forma de luta; Tico-tico, os solidários irresponsáveis que deram a ele seu voto, como se dessem uma roupa velha que não lhes serve mais.

Os três representam, sim, uma nova ordem social e desafiam os padrões pré-estabelecidos. Se notarmos bem, veremos que os grupos que valorizam a mediocridade cresceram tanto que explode hoje a necessidade de se fazerem representar na gestão da máquina pública. Grupos que se caracterizam por análises rasteiras e emocionais, porém de fácil assimilação e altíssimo poder de sedução. Filhos da alienação e limitados pela "mass mídia" formam hoje um imenso exército de adultos que preservam vestígios das fantasias da infância e se satisfazem com explicações baseadas na crendice popular e no poder de personagens que utilizam a afronta como forma de conquistar direitos. Clodovil eleito pelo PTC, Léo Kret pelo PR, Tico-tico pelo PP. Personagens certos nos partidos certos.

Leo Kret é transgênero, mas poderia não ser. Clodovil é gay e isso também não importa. Tico-tico é hetero, um pobre coitado que mal sabe conversar e que venceu com o mote "Me ajudem! Me ajudem! Me ajudem!": os medíocres se compadeceram e decidiram ajudá-lo. Os três com certeza possuem argumentos e elementos de defesa de suas idéias que estão em consonância com os de uma fatia generosa da população, suficiente para elegê-los.

A história tem nos mostrado que o recorte da orientação sexual não é político por si só. As homossexualidades são tão dispersas e íntimas que não são suficientes para construir uma identidade de grupo com resultados eleitorais. O próprio movimento LGBT não se entende em relação às suas identidades.

Nossa estratégia precisa mudar e me atrevo a sugerir que adotemos a mesma usada por Clodovil, Léo Kret e Tico-tico: um novo padrão de inteligência que nos diferencie e nos aproxime de um grupo que possa nos eleger. Um padrão que, ao contrário do deles, evolua, acrescente e venha imbuído de bases mais pacifistas e menos agressivas que o escracho.

O que me consola? O que une esses personagens não é o fato de serem gays. O que os elegeu também não. Eles representam uma camada da população onde eu não me encaixo.

Camisinha sempre!


sábado, 11 de outubro de 2008

Doadores gays – 11/10/2008


Foi em 1985 que o governo norte- americano baixou uma portaria proibindo que os hemocentros de todos os Estados Unidos aceitassem a doação de sangue dos gays que tivessem se relacionado sexualmente com outro homem desde 1977. Quero crer que o medo advinha das poucas informações que existiam sobre uma doença que destruía o sistema imunológico das pessoas: a Aids, que se manifestava principalmente entre os gays de San Francisco, na Califórnia.

Uma atitude prudente, apesar de oferecer um prato cheio para os homofóbicos. Prudente porque a doença surgia entre os homens que, em comum, tinham o fato de serem gays e fazerem sexo com outros homens.

Por precaução, o pouco conhecimento da doença, baseado ainda em indícios, recomendava uma ação preventiva. Prato cheio para os homofóbicos porque legitimava o preconceito, justificava a continuidade de um comportamento excludente da sociedade em relação a nós e ainda negava a importância da nossa luta por direitos que começava a ganhar corpo em todo o mundo.

O debate sobre a doação de sangue pelos gays nos torna, mais uma vez, vítimas das estatísticas. Os gays têm mais tempo de Aids que qualquer outro grupo vulnerável. Foi entre nós que ela foi detectada pela primeira vez, e os nossos altos índices de infecção pelo HIV são de certa forma herança desse desagradável pioneirismo histórico. Acrescente-se o fato de gays fazerem sexo com outros gays, ou com homens que, apesar de não se perceberem homossexuais, transam conosco.

Nesse universo reduzido, as possibilidades de infecção crescem ainda mais, desafiando as ações de prevenção e o uso da camisinha. Fato é que, ainda hoje, os gays não podem exercer sua solidariedade cidadã e se tornarem doadores de sangue.

Em bom "homofobês", é isso que a Portaria 153/04 do Ministério da Saúde diz quando proíbe de doar sangue durante um ano o cidadão que fez sexo com outro homem no último ano. É preciso que se alterem os processos, os protocolos, para que possamos reaver nosso direito de sermos doadores, perdido na história da Aids.

Apesar desse primeiro encontro em Brasília entre o movimento gay e o Sistema Nacional de Sangue ter como objetivo discutir qual a melhor forma de qualificar os profissionais encarregados da triagem dos doadores, tidos como uns dos principais responsáveis pelas práticas preconceituosas contra nós, a portaria em si vem carregada de pontos polêmicos e precisa ser revista com a participação de toda a sociedade. Aos hemocentros cabe, por ora, esclarecê-la e torná-la menos danosa sem colocar em risco a qualidade do sangue que é oferecido à população.

Camisinha sempre!


sábado, 4 de outubro de 2008

Um mimo – 04/10/2008


Os mais recorrentes problemas que atormentam os homossexuais estão no seio familiar. Ao contrário de outros grupos vítimas de preconceito, os gays, além de não contarem com o apoio de sua família, são vítimas de castigo – físico, muitas vezes – na idéia de que "esse menino precisa é levar uma surra para virar homem" – como se o fato de ser gay o fizesse menos homem ou como se uma surra mudasse a personalidade de alguém. São raras as famílias que compreendem a homossexualidade de um de seus membros e se unem solidariamente em sua defesa contra a homofobia.

Muitos pais ainda insistem em tratar a homossexualidade de seus filhos como uma atitude de desobediência, uma travessura que mereça um castigo para que não se repita. Muitos gays adolescentes ainda ficam sem suas mesadas, sem poder sair à noite, proibidos de se encontrar com seus amigos, de frequentar ambientes gays, ou, pior, de se apaixonar por pessoas do seu mesmo sexo – como se fosse possível proibir alguém de se apaixonar. Muitos meninos e meninas arcam com as consequências dessa visão rasa de que é possível forçar a reversão da homossexualidade e que isso se consegue com castigos.

Mas existem exceções. Existem famílias que respeitam as diferenças de seus membros e sabem valorizá-los independente de suas particularidades. O que importa é que as relações sejam estabelecidas com base no amor e no respeito mútuo.

Algumas vezes recebo notícias de comentários elogiosos feito por parentes e amigos que acompanham a minha trajetória. Pessoas que conhecem todo o processo de construção da minha, digamos, cidadania homossexual: da negação adolescente até a transformação em ativismo político e motivo de orgulho. Fico feliz de ver que essas pessoas conseguiram manter sua admiração por mim e não deixaram ofuscar minhas outras qualidades pela particularidade da orientação do meu afeto.

Recentemente, ganhei um mimo de presente. Um cachecol de lã que fora tecido em tricô pela tia Irene, lá de Caratinga, uma tia-avó querida, que, apesar de distante, dedicou seu tempo precioso a tecer um presente para mim. Durante alguns meses, povoei seus pensamentos e recebi um carinho a cada laçada, a cada fileira vencida. Finalmente, ela fez chegar a prenda em minhas mãos emocionadas.

Esse tipo de amor existe. É ele que vence os preconceitos e mantém coesa a instituição família que somos, muitas vezes, acusados de tentar destruir.


Camisinha sempre!

sábado, 27 de setembro de 2008

Reta Final – 27/09/2008



Na reta final das eleições municipais algumas candidaturas abertamente LGBT despontam e é interessante perceber que, apesar dos regionalismos, os problemas que enfrentam não são diferentes.

Léo Mendes, líder do movimento gay do Centro Oeste é um dos fortes candidatos a ocupar uma das cadeiras da Câmara Municipal de Goiânia. “Minha campanha apostou 100% na comunidade LGBT, polarizando com os religiosos: ou votam no candidato gay ou votam no candidato evangélico, quase como um plebiscito. Espero que os eleitores entendam a importância de um candidato que os defenda”, completou. Léo precisa de 6 mil votos e acredita na vitória, bem como seus colegas de PT.

Em Salvador, desponta Marcelo Cerqueira, ex presidente do Grupo Gay da Bahia. “Em 2004 tive 4.838 votos. Dessa vez acredito que supero a barreira dos 5 mil, suficientes para me eleger”. Marcelo está envolvido com as questões ambientais na Grande Salvador, o que abre outras portas para sua atuação política. “Claro que trabalhamos os gays, mas como cidadãos que vivem numa cidade onde os problemas atingem a todos. O fato de ser homossexual é uma sofisticação que amplia nossas chances”, analisa.

No sul de Minas, Sander Simaglio entra pela segunda vez nessa disputa. Em 2006, candidatou-se a Deputado Estadual pelo PV e dos 6 mil votos que obteve só em Alfenas, acredita que menos de 5% foram da comunidade LGBT. “Já os outros 1.700 espalhados pelo estado foram todos dos homossexuais. Mas notamos ainda uma falta de consciência política de nossa comunidade que precisa ser muito trabalhada”, completa. Sander disputa com outros 135 candidatos o voto dos 45 mil eleitores de Alfenas e calcula que poderá se eleger se conseguir chegar a 850.

Em Juiz de Fora, Marco Trajano assiste sua campanha a vereador pelo PC do B crescer e aposta na união da comunidade LGBT local. “Conseguimos reunir todos em torno de uma candidatura com chances reais e hoje assistimos ao crescimento dessa onda: quem nega seu voto ao candidato gay tem sido visto como uma pessoa pouco antenada”, salienta. Apesar de enfatizar sua ligação com o movimento LGBT, Trajano tem trabalhado a população como um todo num discurso de defesa de direitos e promoção da diversidade no Legislativo. Precisa de 4 mil votos para ter chance de ocupar uma das 19 vagas de vereadores na Câmara.

Espero que, nessa arrancada final, nossa comunidade responda ao chamamento político que vem sendo feito por esses e tantos outros bravos companheiros e ajudem a abrir as portas da representação política para o nosso movimento, equilibrando melhor as forças que defendem nossos direitos no Legislativo.

Camisinha sempre!


sábado, 20 de setembro de 2008

Sem referência – 20/09/2008



Minas Gerais possui uma lei que pune a discriminação por orientação sexual. A lei 14.170/2002 que, além disso, cria na estrutura do governo do Estado o Centro de Referência de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros de Minas Gerais, subordinado à Sub-Secretaria de Direitos Humanos, a partir de um projeto elaborado pelo movimento social e que deveria orientar as políticas públicas voltadas para a população LGBT mineira.

Alguma coisa, porém, está destoando. Por um lado, os resultados das mobilizações públicas promovidas pelos mais de 30 grupos LGBT espalhados por Minas Gerais encantam os olhos de qualquer um. O apoio popular à luta pelo reconhecimento de nossa cidadania, dos nossos direitos e contra o preconceito fez com que as Paradas entrassem no calendário oficial das cidades mineiras e deixassem de ser somente a luta de um grupo para se tornar de todos.

Mas, por outro lado, o Centro de Referência do Estado não se envolveu em absolutamente nada e esteve ausente da mobilização de cerca de 600 mil cidadãos e cidadãs mineiros, em defesa da livre orientação sexual, contra a homofobia, temas que fazem parte de suas propostas básicas. Enquanto o movimento LGBT alcança as ruas e conquista aprovação, o governo estadual se mantém distante, refugiando-se na trincheira da realização de uma Conferência Estadual, que aconteceu graças à muita pressão dos ativistas, ou na popularidade do chefe do Estado.

Lamentavelmente, o movimento LGBT organizado não foi sequer ouvido antes das mudanças promovidas recentemente no Centro de Referência. O acordo que acatava a indicação pelos grupos organizados dos responsáveis pelos três principais postos do Centro de Referência, foi ignorado, desconsiderando uma das nossas mais importantes conquistas.

Enquanto os ativistas do movimento LGBT se esforçam para aprovar leis municipais de combate à discriminação, enquanto avançam as importantes políticas públicas municipais de combate ao preconceito, enquanto ganhamos espaço nos municípios, perdemos terreno no estado.

A falta de resolutividade do Centro de Referência tem nos afastado do governo e feito com que continuemos a nos ressentir da sua presença ao nosso lado, na luta contra o preconceito em Minas Gerais.


Camisinha sempre!

sábado, 13 de setembro de 2008

Ideologia – 13/09/2008


O sistema de partidos, que é a base da organização política nacional, na forma como está, não funciona. Quais são aqueles que possuem realmente uma ideologia? Porque é tão simples abrir mão de valores que deveriam ser essenciais aos partidos, quando os interesses eleitorais se apresentam? Como é possível se imaginar uma coligação entre as idéias do DEM, ex-PFL, e do PT? Entre o PSDB e o PT, tradicionais rivais políticos que vêm se revezando na situação e oposição? Entre os comunistas do PCdoB e os evangélicos do PRB?

O Brasil convive com isso há muito tempo e uma das mais tristes e vergonhosas coligações — em vigor até hoje — é a da chapa que preside o país, tendo à frente o operário presidente Lula e o mega-empresário vice José Alencar. De um lado o PT, partido comprometido com a defesa dos direitos dos homossexuais, do estado laico, dos direitos das mulheres; e do outro o PRB, do empresário da fé Edir Macedo e da Igreja Universal do Reino de Deus, que insistem em condenar e negar os direitos desses cidadãos.

Agora, para maior espanto, segundo o "Jornal do Brasil", o PCdoB se comprometeu a apoiar o senador pastor Marcelo Crivella num eventual segundo turno pela Prefeitura do Rio de Janeiro, desde que o PRB intensifique sua participação na campanha da candidata Jô Morais, em Belo Horizonte. Melhor acreditar no presidente do PCdoB, Renato Rabelo, que negou o acordo que jogaria para escanteio, além dos compromissos com os camaradas, a própria candidata dos comunistas, Jandira Fehgali, aliada histórica do movimento LGBT. Crivella, por sua vez, é o autor da expressão "ditadura gay" para se referir ao PLC 122, que criminaliza a homofobia e se encontra tramitando a passos lentos no Senado: um dos mais aguerridos opositores a uma das nossas mais caras bandeiras.

A união entre a esquerda radical e a direita conservadora demonstra que o que menos importa a um bom acordo político são as bases partidárias. Interesses eleitoreiros, loteamento de cargos, vantagens pessoais e privilégios encontram-se anos-luz acima daquilo que deveria ser valorizado como a essência do partido e base de nosso processo de decisão e escolha: sua ideologia.

Até que ponto crenças, convicções e compromissos importam no momento de se fechar acordos que garantam a aprovação de projetos de lei, emendas orçamentárias ou candidaturas? O que temos visto por este Brasil afora são coligações esdrúxulas que confundem completamente o cenário político nacional e revelam um sistema eleitoral fundado em partidos fracos, sem personalidade, no qual os interesses pessoais se sobrepõem às propostas ideológicas.

Camisinha sempre!


sábado, 6 de setembro de 2008

Defeitos – 06/09/2008



Passamos longe da perfeição. Na verdade, nossos defeitos são os mesmos dos heterossexuais: são defeitos de gente, seres humanos. Como qualquer pessoa, lutamos contra e nos envergonhamos quanto nos deixamos levar por eles. Íntimos e desgraçados defeitos.

Numa de minhas digressões, ficava matutando por que os gays adotam um código de deboche e menos valia quando se relacionam entre si. Não só nas situações de humor: insistimos em desbancar os nossos iguais, apontar e ampliar seus defeitos, retirar-lhes valor e menosprezar suas virtudes. Lamentavelmente, nem sempre esse comportamento se mantém no palco dos debochados shows de drag queens, na categoria de recurso artístico. Assistimos esse discurso dominando e alçando seus tentáculos em áreas que precisam ser levadas a sério e onde esse tipo de linguagem não ajuda em nada na construção de uma imagem positiva da comunidade homossexual. Nem no estabelecimento da união entre nós

Somos exímios conhecedores dos nossos defeitos e da luta contra nossos próprios demônios. Sabemos onde estão as nossas fraquezas e, conseqüentemente daqueles com quem nos identificamos. Nossa inconseqüência tem muitas vezes causado danos irreparáveis na trajetória de nossas conquistas. Conscientemente. Sabemos onde dói, onde estão nossos “calcanhares de Aquiles”. Porque somos íntimos dos nossos defeitos.

As seqüelas de uma educação heterossexista homofóbica têm levado os homossexuais ao preconceito contra si mesmos. Nossa menos valia tem feito com que duvidemos de nossa capacidade, questionemos nosso direito ao amor, ao afeto, à nossa própria família, à felicidade. Tem feito com que não consigamos apoiar os nossos iguais pela certeza de que eles possuem defeitos tão imperdoáveis quanto aqueles que não perdoamos em nós mesmos.

Precisamos nos admirar mais, construirmos boas referências, torcer para o sucesso dos outros gays, aplaudir aqueles que conseguem chegar lá e, mais que isso, ajudá-los nesse caminho. Precisamos desconstruir esse notório desamor por nós mesmos e por tudo que se pareça conosco. A ponto de optarmos pelos que não são como nós. A ponto de negarmos nossos próprios direitos.

Camisinha sempre!