sábado, 25 de fevereiro de 2012

Última - 25/2/2012




A partir da semana que vem, essa coluna deixará de ser publicada no Magazine de O TEMPO. No momento em que completa 15 anos, o jornal entendeu que já não fazem mais sentido suas colunas temáticas, GLS e Blequitude. A princípio pensadas para garantir a abordagem de temas como a luta dos gays e dos negros ao menos uma vez por semana nas páginas do jornal, perdem o sentido quando passam a ser incorporados pelas outras editorias e se tornam pautas diárias.

Em 2007, quando fui convidado a assumir a titularidade da coluna GLS, entendi que assumia a tarefa de falar sobre homossexualidade para a população em geral, gay ou não. O TEMPO não é um jornal LGBT e a grande maioria de seus leitores não são homossexuais. O desafio seria, portanto, aproveitar esse espaço e desmistificar o cidadão gay e todos os estereótipos construídos em anos de cultura homofóbica e machista. Ao mesmo tempo, a coluna deveria conversar com os homossexuais e atraí-los para o debate.

Assim, falei de tudo: contei minhas histórias, dos amigos, da família. Tive a oportunidade de debater o casamento gay, os assassinatos e a criminalização da homofobia, as novelas, as propagandas e os escândalos. Pude aplaudir as iniciativas inclusivas, as vitórias do movimento LGBT, a mobilização das paradas. Conversamos sobre aids, sobre camisinhas, sobre juventude, filhos, pais, saúde e educação.

Aplaudi o apoio governamental, mas não deixei de criticar as suas artimanhas. Falamos sobre política, sobre comportamento, relações e amor. Com toda essa visibilidade, reencontrei velhos amigos e conquistei novos. Recebi críticas construtivas e outras nem tanto; fui ameaçado de morte e excomungado dezenas de vezes, mas a grande maioria dos que seguiram essa coluna demonstrou respeito. Diante do desafio da tela vazia, me deixei sorrir, chorar e compartilhar o desejo de um mundo menos excludente.

A partir de hoje, os leitores interessados poderão acompanhar meus comentários semanais pela internet, no site http://oswaldobraga.blogspot.com, onde também estão disponíveis todas as 264 colunas publicadas no Magazine.

Gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais ainda são discriminados e demandam atenção especial e políticas públicas específicas que reduzam a homofobia. Porém, é em casa, no seio de seu lar, que aqueles que não são heterossexuais mais sofrem. Espero que esses cinco anos de reflexões semanais tenham ajudado a reduzir a homofobia e a melhorar a vida dos gays mineiros.

Camisinha sempre!

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Podres poderes - 18/2/2012



O espetáculo em cartaz hoje foi anunciado há muito tempo. As pretensões de poder de líderes evangélicos e suas artimanhas rasteiras são denunciadas sistematicamente pelos movimentos sociais leigos há anos! Charlatanismos, falsos milagres e promessas de vida após a morte, paraísos celestiais, ressurreições, inimizades, desprezos e discriminações. Além de um sorriso e um tapinha nas costas em troca de seu dízimo e seu voto.

Ungidos pela capacidade de trapacear, mentir, enganar os humildes e desesperançosos, um grupo de espertalhões se vale das isenções, dos privilégios e benefícios concedidos aos templos religiosos para a construção de um projeto político que ambiciona uma ditadura teocrata e seletiva. Nas mãos dessa gente mau-caráter não só os avanços nos costumes correm risco, mas a liberdade religiosa como um todo. Nessa salada que junta no mesmo prato religião e política, o ódio e a exclusão servem de tempero.

Enquanto a comunidade LGBT luta pelo reconhecimento de sua cidadania, os tentáculos religiosos espalhados pelos três poderes da União constroem um projeto de negação dos nossos direitos. Foram os fundamentalistas evangélicos que organizaram uma passeata em Brasília contra a criminalização da homofobia, para garantir seu direito de incitarem à violência e pregarem contra nós. Cerraram fileiras para que as escolas brasileiras não fossem capacitadas para combater o preconceito contra os homossexuais: pressionaram e conseguiram suspender a distribuição do material pedagógico chamado de "kit escola sem homofobia", produzido pelo MEC.

Esses mesmos velhacos se levantam contra nossas famílias, contra nossas uniões, contra direitos que não se sobrepõem ou ameaçam os de ninguém. São os evangélicos que nos debocham em seus templos e seus programas de televisão, que nos provocam e nos perseguem. São essas pessoas que, ao se oporem a uma campanha de prevenção às DST-Aids voltada para os jovens gays, deixam claro que preferem nos ver mortos, infectados, subjugados ao vírus HIV a reconhecerem nossa existência e nosso direito à afetividade.

Quando o governo cede à pressão dos evangélicos e decreta a suspensão do filme de promoção da camisinha voltado para os jovens gays porque exibe dois rapazes namorando, assume a responsabilidade sobre o crescimento da Aids nessa população. A reboque, leva as dores e as lágrimas das famílias que sofrem por seus filhos infectados com uma doença que ainda não tem cura, mas que pode ser evitada.

Camisinha sempre!



sábado, 11 de fevereiro de 2012

Isso é difícil - 11/2/2012



Tenho acompanhado de perto todo esse imbróglio da campanha de prevenção às DST-Aids do Ministério da Saúde para o Carnaval 2012, que decidiu focar os jovens gays. Em boa hora! A situação da infecção do HIV entre os gays é demasiado séria para ser ignorada: a prevalência ultrapassa os 10%, enquanto na população em geral não chega a 1%. Nos últimos cinco anos, a Aids entre os gays na faixa de 15 a 24 anos cresceu cerca de 20%. Escolas, famílias e políticas públicas têm ignorado solenemente a existência desses rapazes e o tamanho dessa encrenca.

As campanhas do Ministério da Saúde procuram destacar as especificidades daqueles segmentos da população que se encontram mais expostos ao HIV e dar holofote à vulnerabilidade provocada pelo preconceito e pela negação de seus direitos. Assim, já estiveram em destaque as mulheres, a população negra, as pessoas idosas, as jovens, entre outros.

Como faz habitualmente, ainda no final de 2011, o Ministério constituiu um grupo de trabalho composto por especialistas em prevenção, técnicos em comunicação, representantes da sociedade civil, dos jovens e do movimento gay, que acertaram qual seria o segmento prioritário e as estratégias de comunicação.

Decidiu-se por uma campanha que fosse clara o bastante sem ser vulgar, em que os jovens gays se enxergassem sem estereótipos, que falasse de camisinha, da necessidade de portá-la e de não se esquecer de usá-la. Era importante tomar cuidado com os atores e sua interpretação para não haver dúvidas de que eram gays e que a relação deles chegaria à necessidade do preservativo.

Com essas orientações, abriu-se um processo de licitação em que 12 propostas criativas foram analisadas antes da escolha final. A partir daí, o Ministério realizou dez grupos focais com jovens, gays e heteros, onde se ajustaram detalhes da criação e se fizeram recomendações e alertas.

Não é a primeira vez que os jovens gays são alvos da campanha da Aids. O Ministério da Saúde já produziu filmes que contemplavam os gays em 2007 e 2010, sempre dividindo o foco principal com outros jovens.

Lamentavelmente, quase ninguém viu esses filmes, uma vez que a grade de programação era pequena e concentrava-se em horários de baixa audiência, ao contrário da versão heterossexual, destacada nos horários nobres.

A perplexidade diante da suspensão da divulgação do vídeo lançado pelo ministro Padilha, no último dia 2, revela que a homofobia institucional não escolhe ideologia e que o que orienta as decisões governamentais são acordos políticos e interesses eleitorais, mesmo que isso custe vidas e imploda toda uma política de saúde pública democrática, construída com base em evidências.

Camisinha sempre!

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Cuba - 4/2/2012



A visita da presidente Dilma a Cuba, envolta no debate sobre a garantia e violações dos direitos humanos, revelou o quão áspero é o tema para o nosso país. Quando a presidente reconhece o "telhado de vidro" brasileiro, evita tocar na ferida ou se furta a defender o cumprimento da carta dos direitos humanos num país onde muitos deles são violados, ela, com certeza, sabe que Brasil e Cuba têm mais isso em comum.

Assim como no Brasil, Cuba ainda engatinha no reconhecimento dos direitos dos homossexuais. Em agosto de 2010, Fidel Castro assumiu, em entrevista ao jornal mexicano "La Jornada", a responsabilidade pela perseguição sofrida pelos homossexuais em seu país após a revolução de 1959. "Houve momentos de grande injustiça contra a comunidade gay. E se alguém é responsável por isso, sou eu", reconheceu. Castro referia-se aos milhares de homossexuais assassinados, aprisionados ou enviados para os "campos de reeducação" nos anos 1960 e 1970. Cuba somente viria a descriminalizar a homossexualidade em 1979.

Atualmente, Mariela Castro, a filha do atual presidente cubano, Raúl Castro, tenta convencer a Assembleia Nacional Cubana a aprovar a união civil entre pessoas do mesmo sexo e reconhecer o direito de transexuais à cirurgia de readequação sexual. Mariela é diretora do Centro Nacional Cubano para a Educação Sexual, defensora dos direitos de gays, lésbicas e pessoas trans, e tem provocado grandes transformações positivas na vida dos gays cubanos.

Não tendo muito o que dizer sobre os avanços brasileiros em relação aos direitos humanos, principalmente aos direitos dos homossexuais, nossa presidente evitou eventuais saias-justas diplomáticas. Em entrevistas, limitou-se a se isentar de qualquer responsabilidade sobre a não visita da blogueira Yoani Sanchez ao Brasil, com visto de entrada, mas sem visto de saída.

Apesar dos longos anos de repressão, Cuba possui, hoje, uma vida gay interessante, porém discreta. Os gays, conhecidos como Pájaros, estão em toda parte, mas sujeitos ainda aos resquícios de tantos anos de perseguição. Em busca de informações sobre o assunto, encontrei o seguinte alerta em um guia gay de Havana: "Tome cuidado com a polícia, não por você, mas pelo cara que esteja com você. Aqui, o assédio turístico - quando um cubano se aproxima de um turista - é considerado um delito. Lembre-se que em Cuba existem muitas carências econômicas. Leve seus próprios preservativos quando viajar para Cuba".

Camisinha sempre!