Foi em 1985 que o governo norte- americano baixou uma portaria
proibindo que os hemocentros de todos os Estados Unidos aceitassem a doação de
sangue dos gays que tivessem se relacionado sexualmente com outro homem desde
1977. Quero crer que o medo advinha das poucas informações que existiam sobre
uma doença que destruía o sistema imunológico das pessoas: a Aids, que se
manifestava principalmente entre os gays de San Francisco, na Califórnia.
Uma atitude prudente, apesar de oferecer um prato cheio para os
homofóbicos. Prudente porque a doença surgia entre os homens que, em comum,
tinham o fato de serem gays e fazerem sexo com outros homens.
Por precaução, o pouco conhecimento da doença, baseado ainda em
indícios, recomendava uma ação preventiva. Prato cheio para os homofóbicos
porque legitimava o preconceito, justificava a continuidade de um comportamento
excludente da sociedade em relação a nós e ainda negava a importância da nossa
luta por direitos que começava a ganhar corpo em todo o mundo.
O debate sobre a doação de sangue pelos gays nos torna, mais uma
vez, vítimas das estatísticas. Os gays têm mais tempo de Aids que qualquer
outro grupo vulnerável. Foi entre nós que ela foi detectada pela primeira vez,
e os nossos altos índices de infecção pelo HIV são de certa forma herança desse
desagradável pioneirismo histórico. Acrescente-se o fato de gays fazerem sexo
com outros gays, ou com homens que, apesar de não se perceberem homossexuais,
transam conosco.
Nesse universo reduzido, as possibilidades de infecção crescem
ainda mais, desafiando as ações de prevenção e o uso da camisinha. Fato é que,
ainda hoje, os gays não podem exercer sua solidariedade cidadã e se tornarem
doadores de sangue.
Em bom "homofobês", é isso que a Portaria 153/04 do
Ministério da Saúde diz quando proíbe de doar sangue durante um ano o cidadão
que fez sexo com outro homem no último ano. É preciso que se alterem os
processos, os protocolos, para que possamos reaver nosso direito de sermos
doadores, perdido na história da Aids.
Apesar desse primeiro encontro em Brasília entre o movimento gay e
o Sistema Nacional de Sangue ter como objetivo discutir qual a melhor forma de
qualificar os profissionais encarregados da triagem dos doadores, tidos como
uns dos principais responsáveis pelas práticas preconceituosas contra nós, a
portaria em si vem carregada de pontos polêmicos e precisa ser revista com a
participação de toda a sociedade. Aos hemocentros cabe, por ora, esclarecê-la e
torná-la menos danosa sem colocar em risco a qualidade do sangue que é
oferecido à população.
Camisinha sempre!
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