sábado, 26 de fevereiro de 2011

Casamento - 26/02/2011

Tudo começou em 1995, quando a então deputada Marta Suplicy (PT-SP) apresentou projeto de lei que regulamentava a união civil entre pessoas do mesmo sexo. Barulhentos, os conservadores do Congresso foram à tribuna com suas análises rasas, seus sofismas e discursos inflamados, pincelados de desrespeito, apelo popular e um olhar caricato para o amor entre dois homens ou duas mulheres. Assim, fervilharam expressões machistas de efeito, como "bigodudo beijando careca", "homem entrando na igreja de vestido de noiva", "barbado se esfregando na frente da minha família no restaurante", e coisas do tipo. Por mais que o movimento LGBT esclarecesse que o projeto de lei passava longe dos templos, a opinião pública comprou a ideia de desrespeito vendida pelos políticos religiosos, mal informada sobre o seu real propósito e os direitos que seriam garantidos aos cidadãos homossexuais em relações estáveis.

O movimento LGBT, para desfazer mal-entendidos e reforçar o caráter civil do projeto, passou a tratá-lo como o projeto de união civil. Durante muito tempo, ficamos indignados com a utilização da expressão "casamento gay".

Em 2000, o INSS, por determinação da Justiça Federal, reconheceu os direitos de parceiros homossexuais, com base na mesma legislação que assegura os dos heteros não casados que mantêm uma união estável. O argumento é elementar: se não é preciso estar oficialmente casado para que os direitos previdenciários sejam reconhecidos, os cidadãos homossexuais, em situação semelhante, fariam jus aos mesmos direitos. Passamos, então, a nos referir mais à união estável do que à civil.

Nesta semana, o deputado federal gay Jean Wyllys (PSOL-RJ) anunciou mais um capítulo da novela dos direitos homoafetivos no Brasil: estará protocolando projeto de lei propondo a regulamentação do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. "Tem que ser casamento civil mesmo, porque assegura os mesmos direitos a todos", esclarece. Se aprovada, a proposta colocará o Brasil no mesmo patamar dos avançados países escandinavos, onde o gênero dos parceiros que se casam é o que menos importa.

Mas a discussão está na ordem do dia no mundo inteiro. Nos Estados Unidos, o presidente Barack Obama declarou esta semana que seu governo não defenderá a lei federal que estipula que um casamento é o resultado da união de um homem e uma mulher. A atitude, aplaudida pelos gays norte-americanos, fortalece o movimento mundial que luta pelo reconhecimento das uniões entre pessoas do mesmo sexo. Apesar de o Brasil estar no mesmo patamar de 1995, já era sem tempo que nosso Congresso avançasse no debate desse tema.

Camisinha sempre!



sábado, 19 de fevereiro de 2011

Escola - 19/02/2011



Brasil. 19h. Crianças em casa, banho tomado, janta na mesa e a novela no ar. O drama é íntimo de quem vive a vida real: Thales se declara apaixonado por Julinho. O mesmo Julinho que comoveu o Brasil inteiro ao expor a dor da perda de seu companheiro gay no início da novela. Esse é o Brasil em que vivemos: adultos, crianças, adolescentes, jovens e toda a população brasileira. Esse é o Brasil que pinta até na tela da Globo, tão cotidiano e natural que não tem jeito de se esconder.

A repressão ao amor não faz mais sentido. Não importa qual amor: se entre um homem e uma mulher, dois homens, duas mulheres. As relações homossexuais fazem parte do cenário que é apresentado à nova geração, e isso não assusta (apesar dos avestruzes que insistem em ignorar a realidade que os cerca). Dizer a uma criança que o tio Paulo é namorado do tio Zeca já não cora ninguém.

Recentemente, por iniciativa e pressão do movimento LGBT organizado, o Ministério da Educação se abriu à discussão sobre a homofobia e, consequentemente, a educação de cidadãos capazes de construir e conviver numa sociedade que respeita a diversidade. Respaldados pela Declaração dos Direitos Humanos, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, pelo programa Brasil sem Homofobia; a Conferência Nacional e as dezenas de programas nos quais a comunidade LGBT conseguiu se inserir; pela pressão norte-americana em torno do bullying e as alarmantes estatísticas de suicídios de jovens homossexuais; pelos dados epidemiológicos que apontam a fragilidade dos jovens gays frente à Aids e a homofobia como principal fator vulnerabilizante dessa população; ou seja, cercado de todas as garantias que assegurassem sua defesa no caso de uma acusação de apologia da homossexualidade, o MEC produziu um belíssimo material que orienta as escolas para uma educação sem homofobia.

Pronto. Foi o suficiente para que os conservadores se apropriassem do tema, se arvorassem como defensores das tradições e acusassem o governo e o movimento LGBT de ações que ameaçavam a estabilidade da família brasileira.

Que tipo de cidadãos queremos para o Brasil do futuro? Que educação ele precisa receber? Aquela que reflita a realidade que se apresenta e questione as injustiças das tradições, ou uma educação que perpetue os privilégios numa sociedade hierarquizada a partir de padrões machistas e heteronormativos? Como podemos cobrar coerência de cidadãos que convivem com diferentes raças, credos, orientações sexuais, mas cuja educação formal se nega a debater, corrigir conceitos e orientá-los para uma sociedade de respeito às diferenças e cultura de paz?

Camisinha sempre!


sábado, 12 de fevereiro de 2011

Crendices - 12/02/2011



Apesar de evitar me meter em discussões sobre crenças - uma vez que considero essa conexão entre homossexualidade e religião sem nenhum fundamento -, não posso deixar de reconhecer o mal que certos crentes/conservadores nos causam, principalmente, nesses tempos de bancadas parlamentares religiosas (meu Deus!).

As pessoas que defendem a conservação da humanidade em formol, com base em padrões do passado, querem, na verdade, manter seu poder e ganhar dinheiro. São medíocres! Apregoam como verdade absoluta suas interpretações de mundo viciadas, tendenciosas, primárias e rasas.

Julgam-se aptos a ditar regras para as relações entre os seres humanos, sua moral, sua ética, sua tolerância. Falsos, hipócritas, dissimulados, insistem em negar o processo irreversível de reconhecimento de novas relações afetivas e construções familiares entre as pessoas, mas desfrutam, "no escurinho do cinema", dos orgasmos clandestinos e anônimos amplificados pelo não convencional.

Não me fio em quem atribui a culpa pela sua incapacidade de explicar o inexplicável - ou entender o não entendível - aos "mistérios da fé". Quem age assim se desobriga de pensar e exercitar sua razão (e entrega suas inquietações a um delírio hollywoodiano, em que vidas são criadas a partir de um sopro; serpentes apregoam maçãs pecaminosas; multidões atravessam oceanos que se abrem em tecnicolor; seres fantasmagóricos compartilham nosso espaço e transitam por dimensões controlando raios e trovões, entre outros efeitos especiais). Nossa civilização não é o resultado de um delírio épico.

Em tempos de microscópios nucleares e satélites exploradores, quando se fala de reprogramação genética, células-tronco e vacinas sintéticas, em um mundo que questiona a existência de fronteiras geográficas, que baseia seus contratos internacionais em valores como a dignidade humana, a solidariedade, o foco no coletivo e o respeito às opções individuais, qualquer argumento que se baseie em crendices, símbolos e superstições é questionável. E suspeito.


Camisinha sempre!


sábado, 5 de fevereiro de 2011

Ao governador - 05/02/2011



O movimento LGBT quer conversar com o Governador Anastasia. Mais que isso, quer parar de choramingar e qualificar, política e tecnicamente, o debate sobre a ausência de ações públicas estaduais no combate ao preconceito por orientação sexual e identidade de gênero, para que não se perpetuem os equívocos e se reverta a inatividade da gestão anterior. 

Essa é a intenção do ofício encaminhado pelo Fórum pela Saúde e Direitos Humanos LGBT de Minas Gerais, que congrega 30 organizações da sociedade civil do Estado. No documento, o fórum lembra a importância de se incluir na agenda para 2011 a chamada para a 2ª edição da Conferência LGBT de Minas. A primeira foi realizada em 2008, como etapa estadual da 1ª Conferência Nacional que destacou o Brasil como o primeiro país do mundo a convocar um fórum de discussão entre governo e sociedade civil para tratar dessas necessidades. 

Grande parte das deliberações firmadas na conferência de 2008 não passou do campo das intenções, o que tem provocado consequências bastante danosas a Minas, hoje, um dos Estados brasileiros onde mais se mata por homofobia. 

Apesar do nosso pioneirismo nas conquistas legais, vários Estados estão à nossa frente nos esforços públicos para a garantia de direitos dos homossexuais e o combate à homofobia. Exemplos disso, são as populares "Leis Rosas", que se espalharam por dezenas de municípios mineiros e alcançaram o Legislativo estadual. Nos últimos seis anos, porém, a ineficiência dos órgãos estaduais fez com que todo o histórico de parceria e participação popular na construção de políticas públicas voltadas para a emancipação da população LGBT se perdesse. 

O movimento mineiro quer resgatar esse tempo perdido e conversar com o governador sobre a construção e implantação de um Plano Estadual de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos LGBT, a ser construído em conjunto com o movimento. Além disso, quer entender melhor as propostas da recém-criada Coordenadoria da Cidadania e Direitos Humanos LGBT na estrutura do Executivo e garantir que ela disponha de orçamento próprio, e que, efetivamente, funcione para a comunidade LGBT. 

Por fim, o fórum quer propor ao governador Anastasia a criação do Conselho Estadual da Cidadania e Direitos Humanos LGBT, com a garantia de representação da sociedade civil. O conselho teria como principal incumbência o controle social sobre as ações previstas no Plano LGBT. 

Para além da extensa pauta proposta, entretanto, é fundamental que o governador conheça o ponto de vista da sociedade civil e de suas lideranças sobre o quadro dos direitos LGBT em nosso Estado, sem retoques e maquiagens, e se torne nosso aliado na recuperação desse tempo perdido. 


Camisinha sempre!