sexta-feira, 28 de maio de 2010

Conservadores - 29/05/2010




Tenho pensado muito sobre a covardia dos conservadores. Nada justifica tanto medo de mudanças, a não ser a vida boa de hoje; assim, do jeito que está. Será mais difícil manter o poder pela força ou pela promessa de soluções milagrosas para os problemas, numa sociedade aberta às diferenças e disposta a acolher a diversidade da natureza humana. Pois, é isso que eles temem. Os conservadores estão no poder, mas conhecem sua fragilidade e o risco de perdê-lo. Medo de largar o osso, medo do novo, do desconhecido.

Conservadores sempre existiram, mas não foi graças a eles que chegamos onde estamos. Nossos navegantes não tiveram medo de buscar o novo e chegaram aqui desafiando o desconhecido. Enquanto avançamos em descobertas que vão do controle do fogo ao deslocamento do centro do universo; da penicilina à reprogramação genética de bactérias, os conservadores ainda acendem suas fogueiras-fortalezas que matam e retardam o avanço natural da inteligência coletiva, com base em tabus sexuais e no desrespeito às diferenças.

E é através principalmente do poder político e do controle dos meios de comunicação que eles nos induzem a acreditar que são nossas as suas causas, que são nossos os seus interesses. Um processo retroalimentado permanentemente por um discurso elementar que sustenta a fragilidade de uma ideologia que naturalmente tende a fenecer. Os conservadores são covardes e por isso gritam e vociferam contra os que defendem seu direito a novos tempos, novos conceitos, uma nova ordem social.

Dias antes da Marcha contra a Homofobia em Brasília, a Câmara dos Deputados convocou uma audiência pública para discutir o Estatuto da Família. Entre os convidados com direito a voz estavam de um lado defensores das famílias homossexuais, e do outro, religiosos fundamentalistas.

Enquanto representantes da Frente Parlamentar pela Cidadania LGBT, lideranças do movimento e notáveis apresentavam o retrato da homofobia brasileira, com pesquisas e dados estatísticos, os religiosos bradavam blasfêmias e ofensas de efeito, num evidente afronta aos direitos humanos dos cidadãos homossexuais. Dentro do Congresso Nacional, o Legislativo brasileiro se sujeitou à dominação e ao desrespeito promovido pelos evangélicos. É preciso mudar essa lógica. Não faz mais sentido garantir privilégios a quem desconsidera a nossa constituição, incita a violência e promove uma sociedade de castas.

Camisinha sempre!


sábado, 22 de maio de 2010

A marcha - 22/05/2010


Foto de Alexandra Martins

A ideia de se realizar uma marcha LGBT a Brasília, nos moldes das que fazem centenas de outros movimentos sociais, vez por outra voltava à nossa pauta de discussões. Tomou força em 2008, por ocasião da Conferência Nacional LGBT, mas acabou frustrada por não ter sido proposta pelos grupos majoritários do movimento. Dessa vez, porém, aconteceu, capitaneada com brilhantismo pela ABGLT - Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais - que, na última quarta-feira, esteve à frente da 1ª Marcha LGBT contra a Homofobia, realizada em Brasília.

Ela inaugura uma nova etapa na história de luta dos LGBT em nosso país. Ao invés de uma parada com música eletrônica, milhares de ativistas de todo o país enfrentaram horas e horas de uma desconfortável viagem, noites mal dormidas e pouco dinheiro, para, envolvidos pelas cores do arco-íris, engrossarem o coro dos insatisfeitos com a morosidade na implantação de políticas públicas voltadas para a nossa comunidade.

A marcha foi um sucesso emocionante. O número de participantes é o que menos importa. Segundo Toni Reis, presidente da ABGLT, existem outros números que impressionam. Nos dias que a antecederam, 14 dos 18 ministérios receberam em audiência as comissões LGBT; 537 organizações sociais, entre elas as maiores centrais sindicais e os principais partidos políticos brasileiros, assinaram o manifesto da marcha, endossando os cinco pontos principais reivindicados pelo movimento: a garantia do Estado laico; o combate ao fundamentalismo religioso; o cumprimento do Plano Nacional LGBT, que reúne as decisões retiradas da Conferência Nacional; a aprovação do PLC 122, que criminaliza a homofobia; e o julgamento das ações que se encontram no Judiciário, entre elas um parecer sobre a união estável entre casais homossexuais e a mudança do registro civil de pessoas transexuais.

Imbuída de um caráter pluripartidário, mais de 50 parlamentares de quase todos os partidos tiveram direito ao uso da palavra no carro de som. No gramado da Esplanada dos Ministérios, 198 cruzes lembravam os LGBT assassinados por homofobia em 2009.

Além da renovação dos compromissos do governo com a defesa dos direitos dos homossexuais, aguarda-se para os próximos dias, a assinatura, pelo presidente Lula, do decreto que oficializa o dia 17 de maio como o Dia Nacional de Combate à Homofobia. Se tudo der certo, será a primeira lei federal a favor dos LGBT desde a promulgação da Constituição de 1988. Um dia para não se esquecer jamais.

Camisinha sempre!



sábado, 15 de maio de 2010

`Veja´ não viu - 15/05/2010



A revista "Veja" da semana que passou dedicou sua capa aos jovens homossexuais. A matéria, por um lado, naturalizou positivamente a diversidade sexual e destruiu antigos estereótipos. Mas pecou nas generalizações e escorregou em novos preconceitos como a alienação política ou o desinteresse pela defesa de seus direitos, atribuídos aos novos gays e lésbicas.

A matéria tenta mostrar o retrato de uma juventude homossexual que, sim, já desfruta dos ganhos advindos de décadas de lutas, confrontos e estratégias protagonizadas pelo movimento LGBT. Exibe jovens com um mínimo de conforto, universitários, que convivem com pessoas estruturadas e têm garantia de acolhimento e amor. Jovens capazes de estabelecer negociações que avançam numa mudança de comportamento, na revisão de conceitos retrógrados e no estabelecimento de novas bases de respeito.

Mas, apesar do prazer de constatar a existência dessa juventude livre e feliz, não vi o Mateus, 23 anos, branco, tímido, pobre, filho de pobres, criado no interior de Minas pela tia que o acolheu quando o pai o expulsou de casa aos pontapés por ser gay. Excluído do mercado de trabalho por homofobia e arrasado porque recebeu recentemente a notícia de que se tornara soropositivo. Ou o Tiago, negro, 21 anos, que divide uma casa com pais e outros cinco irmãos que não falam com ele porque não gostam de gay. Desempregado, Tiago foi obrigado a interromper os estudos, e hoje não possui qualificação que lhe garanta um mínimo de empregabilidade.

Ou será que "Veja" não tem informações sobre pessoas como a Jessy Lane, travesti que, ao sorrir, escondia a boca com as mãos para não expor os poucos dentes que lhe restavam; que sofria de uma anemia falciforme que tirou sua vida aos 24 anos, antes que tivesse tempo de conquistar seus tão sonhados peitos de silicone. Ou a Carolina, 17 anos, que se refugia na casa da avó porque seus pais não aceitam sua namorada; parou de estudar e passa seus dias entediada diante de uma TV ou vagando pela rua.

Dia 19 de maio, caravanas de todo o país estarão se dirigindo a Brasília, onde participarão da 1ª Marcha Nacional Contra a Homofobia e do 1º Grito Nacional pela Cidadania LGBT e Contra a Homofobia. Gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais estarão manifestando sua indignação com a falta de políticas públicas efetivas que combatam o preconceito por orientação sexual.

Na linha de frente, centenas de bravos e indignados jovens homossexuais brasileiros. Jovens que "Veja" não viu.

Camisinha sempre!


domingo, 9 de maio de 2010

Adoção - 08/05/2010





O Superior Tribunal de Justiça reconheceu, no dia 27 de abril, o direito de casais homossexuais adotarem filhos. A decisão se deu a partir do processo iniciado por um casal de lésbicas gaúchas, que ganhou o reconhecimento de seu direito na Justiça Federal do Rio Grande do Sul. O Ministério Público do Estado questionou a decisão e o caso foi parar no STJ, que, por unanimidade, deu ganho de causa às moças. O caso abre jurisprudência para situações semelhantes em todo o país, traz de volta o debate sobre o assunto e dá holofotes ao esperneio dos conservadores.

A polêmica não é nova. O projeto de lei que pretendia reconhecer a união civil entre pessoas do mesmo sexo, de autoria da então deputada Marta Suplicy, data de 1995 e já incluía a restrição da adoção aos casais gays. Uma estratégia para evitar a oposição ao projeto como um todo. Além de não conseguir seu intento, no frigir dos ovos, tal "senão" enfraqueceu o reconhecimento das famílias homoafetivas e nos atribuiu posições que não eram nossas, como se concordássemos com a incompatibilidade entre ser gay e educar uma criança.

Inúmeros pesquisadores se dedicaram a analisar a situação de crianças criadas por casais homossexuais e nenhum deles encontrou evidências que possam restringir a adoção. Só nos Estados Unidos, existem de dois a dez milhões de pais e mães gays e lésbicas que educam de seis a 14 milhões de crianças. Estudos desenvolvidos na Universidade da Califórnia concluíram que "as crianças criadas por pais do mesmo sexo estão muito bem. Nos indicadores que mais nos preocupam, como autoestima, desempenho escolar, ajustamento social e assim por diante, filhos de casais homossexuais são estatisticamente indistinguíveis dos filhos de casais heterossexuais".

Não há nenhuma pesquisa que comprove que a orientação sexual dos pais influenciará a dos filhos, mas, teoricamente, filhos de casais do mesmo sexo estariam mais propensos a assumirem sua orientação sexual, seja qual for.

A instabilidade das relações entre pessoas do mesmo sexo é outro argumento contrário à adoção, porém, as estatísticas de divórcios no Brasil são sempre crescentes, o que, convenhamos, não define propriamente matrimônios estáveis entre os heterossexuais.

Por fim, a ideia de que esses adotados carecerão de referências do sexo oposto escancara o preconceito: quantas crianças criadas por homens e mulheres separados, ou homens e mulheres viúvos, não apresentam qualquer dificuldade de se referenciarem sobre o sexo oposto?

Em sua decisão, o ministro João Otávio de Noronha ressaltou o que realmente importa: "deve-se atender sempre ao interesse do menor, que é o de ser adotado".

Camisinha sempre!


sábado, 1 de maio de 2010

Apoio de Mãe - 01/05/2010


O retorno que recebo até hoje pelo meu depoimento na novela "Viver a Vida" é sempre positivo. É claro que os homofóbicos fizeram suas piadas e destilaram seu preconceito, mas, entre os racionais, a polêmica não foi tão a fundo: Ana Alice se admirou positivamente por eu ter tratado Marquinho por "meu marido" e o Irineu, que é casado há 16 anos com outro homem, não gostou: "... acho tão ou mais conveniente ‘meu companheiro’". Conveniente para quem, Irineu? Talvez para aqueles que ainda se incomodam com o fato de dois homens viverem casados, o que vai além de um simples companheirismo, convenhamos. Como disse recentemente o estilista-militante Carlos Tufvesson: "Como posso chamar de amigo o homem com quem sou casado há 15 anos?".

Fora isso, as manifestações foram de emoção, de espanto ao me reverem de forma tão inusitada, de identificação com a história a que assistiram e, principalmente, os votos de um desfecho feliz para o que ainda não terminou. Caso você não tenha visto, ainda é possível assistir pela internet (em https://www.youtube.com/watch?v=wVyHziTlU9A).

Entre os e-mails recebidos, muitas mães de homossexuais, incentivadas pelo alerta da querida Edith Modesto, fundadora do GPH - Grupo de Pais de Homossexuais -, associação que agrega e orienta pais e mães de gays e lésbicas em todo o Brasil (www.gph.org.br). Os depoimentos dessas mães provavelmente superam o meu:

Silvana Machado: "Fico particularmente satisfeita quando vejo modelos positivos divulgando que homossexualidade não é sinônimo de anormalidade. (...) Foi muito bom!".

Clarice Cruz: "(...) nunca tive problemas em aceitar meu filho; meu único sofrimento é saber que ainda exista muito preconceito".

Ângela Moysés: "O seu depoimento foi um incentivo aos jovens para que vivam sua orientação sexual, para que sejam quem realmente são, sem disfarces, sem subterfúgios, sem armários".

Cristina Sábata: "Fiquei muito emocionada e muito feliz também ao ser veiculada, em horário nobre e em cadeia nacional, mensagem tão bonita e positiva quanto a sua!".

Adriana Novak: "Achava que essa história de ser homo era coisa de má companhia, influência de amigos. Hoje minha filha está com 15 anos, consegui reconquistá-la e respeitar o seu amor".

Cristina: "Obrigada por sua mensagem, pois iniciativas como essa ajudam muito para que as pessoas sejam levadas à reflexão e que mais caminhos se abram perante a sociedade rumo à aceitação da diversidade sexual de forma natural e respeitosa!".

Camisinha sempre!