Que felicidade! Exultante, corre o atacante vitorioso em direção à
torcida, enquanto seus companheiros o perseguem. Num gesto impetuoso, ele tira
sua camisa e exibe um abdome recortado, o tórax seco, sem um grama sequer de
gordura. Um atleta que tem a noção exata do seu momento de glória, quando
milhões de olhos encantados se voltam para ele. Um homem que exala sedução por
todos os poros. A torcida vem abaixo, se encanta incontinente com a figura do
ídolo descamisado quando seus colegas o alcançam para o glorioso abraço que
consolida o espírito de time e o sucesso do trabalho conjunto. Um caloroso
momento íntimo-coletivo em que corpos suados, mãos, caras, bocas e sexos se
esfregam sem censura ou qualquer tipo de limite machista. Um homoerotismo que
contagia todo o estádio, um ambiente masculino por essência, diante dos olhos
de milhares de homofóbicos.
É gol! Que felicidade!
O assunto futebol está presente neste final de Campeonato Brasileiro. Eis que alguém me pergunta para
que time eu torço e respondo orgulhoso: "Cruzeiro!". "Ah! Claro!
Só podia ser!", responde. " Por quê?", replico já adivinhando a
resposta: porque sou gay e o Cruzeiro seria o "time dos gays". Eis a tola explicação
para sua óbvia conclusão chauvinista.
Encontrei duas hipóteses que
explicariam essa ligação: a primeira diz respeito à origem do Cruzeiro. O clube
foi fundado pela colônia italiana de Belo Horizonte, pessoas cultas, que se
vestiam bem e se comportavam com educação nos estádios. Logo, todo cruzeirense
seria gay, pois segundo essa lógica troglodita, ser culto e educado não é coisa
de macho.
A outra história tem a ver
com o goleiro Raul Plassmann, famoso no Cruzeiro, depois no Flamengo e até na
seleção brasileira. Numa época em que os goleiros se vestiam invariavelmente de
preto ou cinza e "homem que era homem" não vestia roupa colorida,
faltou a camisa do Raul e improvisaram uma substituta para que pudesse jogar.
O jovem bonito, louro e
cabeludo desafiou os costumes e defendeu o Cruzeiro com uma
camisa amarela que se tornaria sua marca registrada. Naquele momento, Raul
ganhou a alcunha de "Wanderléia", em referência à cantora loura da Jovem Guarda.
E a torcida do Cruzeiro, o título pejorativo de "time de bichas".
A homofobia precisa ser
questionada. Hoje, a camisa amarela não representa mais um sinal de
feminilidade, os jogadores se exibem nos estádios e em revistas gays, mas os
cruzeirenses continuam ligados aos homossexuais. Contudo, isso nos trouxe
também avanços, uma vez que as torcidas organizadas Crugay e Rosa Azul são
aceitas e respeitadas nos jogos do Cruzeiro.
Camisinha sempre!