sábado, 29 de setembro de 2007

Travestis e transexuais - 29/09/2007


Como conversamos pouco sobre as travestis e transexuais! É preciso que nos apropriemos das informações sobre as pessoas trans e que entendamos melhor o processo que se passa dentro delas.

Travestis e transexuais podem ser nascidos homens ou mulheres. Trans nascidas homens adotam identidade e aparência feminina e devem ser tratadas no feminino: sua identidade de gênero é feminina. Por isso nomes e vestes femininos, corpo com contornos femininos e comportamento coerente com o que se espera desse gênero. Trans nascidos mulheres adotam a aparência de rapazes e o tratamento adequado, nesse caso, é o masculino. O mais comum é encontrarmos travestis femininas, ou seja, nascidos homens com identidade feminina. São pessoas que quebram todas as construções heterossexistas dominantes de gênero - masculino e feminino - se entendem e se identificam com as características do outro gênero que não o seu, e são vítimas de preconceito 24 horas por dia, sem descanso.

Travestis não são homens que viraram mulheres ou que tentam parecer mulheres. Na verdade, travestis são travestis e é isso que procuram ser. Nunca uma travesti será uma mulher, uma vez que não nasceu assim e normalmente não é essa sua proposta. E, curiosamente, as travestis reproduzem e fortalecem a exuberância do masculino como o encontramos na natureza - vide as plumagens alegóricas dos pavões ou as jubas revoltas dos leões: travestis normalmente adotam cabelos muito grandes, quadris e seios de silicone sempre avantajados, vestígios inevitáveis do seu lado masculino.

Transexuais, por outro lado, são pessoas que não se enquadram identitariamente no seu sexo biológico de nascença. Se olham no espelho e se enxergam do sexo oposto. São pessoas que não são felizes com sua genitália e não se adequam aos padrões que a sociedade tenta lhes impor. São cidadãs diagnosticadas por especialistas e que necessitam passar por uma intervenção cirúrgica difícil e perigosa.

Cirurgias de transgenitalização - ou adequação sexual, uma vez que se estará adequando corpo à psique - recentemente foram incluídas nos procedimentos cirúrgicos cobertos pelo SUS, numa demonstração de respeito e coerência com a universalidade em que se baseia o nosso sistema público de assistência á saúde. Essa atitude evita que nossas transexuais caiam nas mãos de charlatões. As cirurgias são caras, invasivas, de alto risco e executadas por pouquíssimos médicos no Brasil. E, da mesma forma que em outros procedimentos difíceis e/ou ilegais - como interrupção da gravidez indesejada ou aplicação de silicone industrial - sempre aparecem clínicas e profissionais inescrupulosos que agem na clandestinidade, causando danos físicos irreparáveis naquelas que buscam a realização de um desejo ou a solução de um problema.

Os transtornos, entretanto, não param por aí. Existe todo um constrangimento social que advém dessa transformação, ainda sem solução legal, como a mudança dos documentos daquelas pessoas que passaram por uma cirurgia de transgenitalização e que são obrigadas a carregar seu nome de nascença. É fácil imaginar a saia justa em que se transformam pequenos atos como o pagamento com cheques, utilização de cartões de crédito, a identificação em aeroportos e rodoviárias, enfim, uma desconfiança constrangedora toda vez que as companheiras são obrigadas a apresentarem seu RG com nome de rapaz.

É preciso entender que identidade de gênero difere fundamentalmente de orientação sexual e isso confunde ainda mais as pessoas. Quando falamos de orientação sexual estamos nos referindo a hetero, homo ou bissexualidade; quando falamos de identidade de gênero estamos falando de travestilidade e transexualidade. Assim, as transexuais podem ser heterossexuais, na medida em que se entendem mulheres e seu desejo é dirigido aos homens, como qualquer mulher heterossexual; ou homossexuais, caso tenham seu desejo dirigido a outras mulheres, como as lésbicas.

Entender a natureza humana vai muito além de oferecer o ombro a um amigo ou acolhê-lo em suas dúvidas e incertezas. Existem dramas humanos que precisam ser acolhidos e compreendidos, sob o risco de nunca alcançarmos a universalidade que os direitos humanos exigem e apregoam.

Camisinha sempre!

Falta moral aos evangélicos – 29/09/2007


"Gays
A Constituição do Brasil dá o pleno direito da livre manifestação de pensamento e de opiniões. Sem ofender, podemos discordar de qualquer posição das pessoas. Eu discordo da prática gay, por isso, oro para que os gays abandonem as práticas que adotam e se voltem para Deus, Criador de machos e de fêmeas, conforme o registro da Escritura Sagrada, abraços.
Pastor José Vieira Rocha
Presidente da Ordem dos Pastores Batistas do Brasil."
(Tribuna de Minas – 28/09/07)

Se você, pastor Vieira, se sente no direito de discordar da "prática gay" e pregar contra uma camada da população, deve concordar que não somos obrigados a nos calar diante do que discordamos em suas igrejas. Ainda não temos uma lei que nos forneça ferramentas para criminalizá-los em seus discursos excludentes e inflamado de ódio contra os homossexuais. Porém, vocês continuam fazendo uso desse "direito adquirido" de nos difamar e incitar a população contra nós.
O discurso anti-homossexuais promovido por pastores como você tem legitimado e justificado a violência contra nós, em nome do seu deus. Temos sido covardemente julgados por vocês, que não possuem moral suficiente para nos condenar. Temos sido o alvo preferido de religiosos que não conseguem sequer evitar que o demônio entre em seus templos e corrompa seus seguidores. Estamos sendo julgados e condenados por igrejas em cujos quadros dirigentes encontramos ladrões, estupradores, pedófilos, traficantes de drogas, trambiqueiros, charlatões e toda a corja de aproveitadores a quem não restou outro golpe senão tapear a população ingênua e desesperançosa que precisa acreditar em milagres para sobreviver. 
E vocês oferecem isso. Oferecem a ilusão de soluções fáceis para problemas difíceis, que ultrapassam em muito o campo da fé. Oferecem soluções milagrosas e divinas para problemas financeiros, afetivos, de baixa auto-estima, de desemprego, enfim, problemas que não se resolvem com orações. Vocês alienam a massa operária que deveria estar buscando soluções na disputa política e democrática por um país mais justo.
Vocês tapeiam seus seguidores. Vocês utilizam técnicas de auto sugestão, através da repetição de sons, aceleração da respiração, promovendo uma catarse coletiva que é a característica de tantas seitas condenadas que levaram centenas de pessoas a suicídios coletivos. Vocês cobram pelas benesses divinas e se enriquecem às custas da ingenuidade de seu rebanho. Vocês conduzem o voto, cobram obediência e utilizam o púlpito de suas igrejas para enaltecer seus pastores-candidatos como representantes do "povo de deus" e defensores da moral.
Hipócritas, pregam a abstinência, mas os jornais noticiam seu envolvimento em orgias com suas obreiras; pregam a fidelidade, mas são incapazes de se manterem fiéis a suas parceiras e estão sempre metidos em escândalos que passam pela violência sexual contra as mulheres, quando não atingem crianças, em casos escabrosos de pedofilia. Pregam a virgindade pré-matrimonial, mas estão sempre envolvidos em relações clandestinas com suas ovelhas não-castas. Defendem a família e são incapazes de manter a sua.
Nenhuma das igrejas tem se mostrado ilibada o suficiente para trazer para a si a tarefa de educar nossos jovens e crianças. As igrejas não são confiáveis, finjem estar fincadas em bases teológicas e autruistas, mas dirigem suas ações com base nos aspectos econômicos que as sustentam e enriquecem seus padres e pastores. Graças à ingenuidade de milhares de infelizes cidadãos que os tornam cada dia mais ricos e poderosos.
E isso, pastor Vieira, não tem sido dito porque não nos interessa destruir a sua igreja nem negar os seus direitos, como você insiste em fazer conosco.
Essa falsa polêmica tem dado holofote demais a pessoas como você. Vocês têm estado presente na mídia graças a esse factóide barato criado para dar chance de destilarem seu veneno e sua ira contra nós. Não queremos gastar nossas energias com pessoas como vocês. Não vale a pena chutar cachorro morto.
Mas de uma coisa esteja certo: não nos acovardaremos. Se vocês querem o confronto, iremos a ele. Se vocês estão dispostos a fazer da nossa cidade uma Palestina fundamentalista e provocarem uma guerra santa, estamos prontos para ela. E vamos vencer, em nome de nossos direitos e de nossa cidadania.

sábado, 22 de setembro de 2007

A ameaça que vem em nome de Deus – 22/09/2007


Não existe unanimidade quando se trata da defesa dos direitos dos homossexuais. Ainda existem aqueles que consideram o amor entre iguais um não-direito e estou me referindo especificamente ao discurso que temos ouvido por parte dos evangélicos e da ala conservadora da Igreja Católica, não só em seus cultos, mas também nas TVs, rádios e nos microfones de Assembléias Legislativas, Câmaras e Senado.
Os religiosos partiram para um confronto direto com os homossexuais. Gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais foram escolhidos por eles para representarem o mal na terra, a personificação do pecado, seres humanos de segunda categoria que não devem ser beneficiados por qualquer tipo de legislação que os proteja e garanta seus direitos.
Que direitos são esses? Direitos humanos básicos como o de ser quem se é, de direcionar nosso afeto a quem julgarmos merecedor dele. Direito de constituirmos uma família e planejarmos um futuro, de participarmos dos rumos da nossa nação; de sairmos às ruas e mostramos que não temos vergonha de sermos gays brasileiros e exibir o nosso orgulho disso.
Temos testemunhado recentes manifestações fundamentalistas que preocupam e revelam a ponta de um iceberg traiçoeiro. Não é de hoje que os evangélicos têm sido invasivos e desrespeitosos. O Rainbow Fest e as paradas gays, por exemplo, sempre foram tomados por panfletários militantes evangélicos que distribuíam folhetos que nos condenavam e se intrometiam em searas perigosas como a saúde pública, atribuindo a Aids a um castigo divino e iludindo a população com a idéia de imunidade ao HIV aos que se entregam a Jesus Cristo – ou às suas igrejas caça-níqueis.
Em junho deste ano, em Campina Grande (PB), evangélicos se sentiram no direito de iniciar uma campanha condenando os homossexuais, utilizando inclusive outdoors espalhados pela cidade. Grupos GLBT e evangélicos chegaram a se confrontar em praça pública com seus carros de som, faixas e palavras de ordem. Na TV, o pastor Silas Malafaia invade o almoço de sábado das famílias brasileiras para, aos brados, desrespeitar os homossexuais, incitar a violência contra nós e sofismar em cima de uma lógica que não se sustenta a não ser no falso moralismo e na gritaria de quem não tem argumentos para defender suas idéias. No Senado, o pastor Marcelo Crivella (PRB-RJ) é o portavoz de um grupo de religiosos que não descansará enquanto não negar cada um dos direitos humanos que restam aos homossexuais e garantir a impunidade àqueles que manifestarem preconceito contra nós, combatendo o PLC 122/06 que poderia aliviar o triste cenário da homofobia no Brasil, tornado-a um crime.
Na outra ponta, o papa Bento XVI reforça sua obsessão em relação aos homossexuais repetindo o mesmo discurso homofóbico em sua peregrinação pelo mundo. Esquece-se de se indignar com as feridas morais no seio da sua própria igreja, como o envolvimento sexual de seus padres com crianças inocentes, que definitivamente não a credenciam a julgar o comportamento de quem quer que seja ou a defender quaisquer valores que orientem nossa sociedade.
O estado laico brasileiro foi invadido por uma bancada religiosa que insiste em orientar as decisões políticas nacionais pelos ditames bíblicos. Políticos que se escondem por trás do "mistério da fé", como se misterioso não fosse também o que se passa nos bastidores de seus templos ou como se as mazelas de nossa pátria se resumissem a uma questão de fé. As bancadas religiosas têm defendido seus interesses pessoais em detrimento dos demais cidadãos brasileiros que não rezam o seu mesmo credo. Os avanços nos direitos dos cidadãos brasileiros têm sido postergados por suas visões preconceituosas e as injustiças vêm se perpetuando através desse discurso bíblico que reinterpreta os textos sagrados tendenciosamente, de forma a justificar aquilo que lhes interessa.
Camisinha sempre!

sábado, 15 de setembro de 2007

A lição que vem do interior – 15/09/2007


O interior de Minas Gerais tem sido um exemplo na conquista de direitos dos homossexuais. Com garra e dedicação, mesmo sem o apoio do governo federal – importantíssimo nos anos anteriores – gays, lésbicas, travestis, transexuais e bissexuais dos rincões mineiros estão organizando seus eventos e mostrando às prefeituras e aos programas municipais de DST-Aids a importância das Paradas do Orgulho Gay como reconhecimento e garantia de direitos dessa importante parcela da população de suas cidades.
Foi assim com as Paradas de Alfenas, de Contagem, Betim, Itaúna, Barbacena, Juiz de Fora, Uberlândia, Uberaba e ainda vai ser em uma dezena de cidades onde os homossexuais organizados se mobilizam: nossa cidade não pode deixar de ter uma parada do orgulho gay! Talvez aí esteja um dos maiores méritos de nossos bravos gays do interior.
Não é tarefa para covardes expor sua orientação sexual ou identidade de gênero em cidades pequenas, conservadoras, onde todos se conhecem e se sentem no direito de se envolver na vida de todos; onde a homofobia é entendida como parte essencial da formação do masculino e os homossexuais vistos como doentes, pecadores e moralmente desviados. Aos gays do interior é exigido coragem para amar e desafiar os padrões estabelecidos.
Eles não dispõem de espaços de socialização, mas criam alternativas para se encontrarem e se reconhecerem. No mapa da cena gay de Minas Gerais encontramos cidades pólos que atraem homossexuais da vizinhança por oferecerem poucas, mas honrosas e prestigiadas opções: bares, boates, saunas, grupos de convivência ou as ONGs que cumprem esse papel de construção da identidade gay com bastante propriedade.
E o interior-conservador-mineiro tem nos surpreendido pela modernidade, pela aceitação e apoio que temos recebido e pelas idéias inovadoras que têm surgido em nossas montanhas. Talvez as grandes e tradicionais famílias mineiras estejam reconhecendo a existência de seus filhos e filhas homossexuais, cansadas de mantê-los escondidos no quartinho dos fundos, se envergonhando de seu comportamento e modos.
A presença das famílias nas Paradas, nas reuniões e eventos organizados pelos gays do interior é marcante. Isso fortalece demais a nossa auto-estima. Assim como nos deixa encantados ver que muitos pais e mães fazem questão de iniciar seus filhos na convivência com a diversidade sexual, mostrandoos que nem todos são iguais e que o que torna indigno um ser humanos não é o tipo de amor que ele sente e o tipo de relações afetivas que estabelece.
A homofobia no nosso estado ainda não acabou. Muitos jovens ainda estão se matando por não suportar a pressão que o preconceito lhes impõe. Muitos são obrigados a deixarem suas cidades, o aconchego de seus amigos, a proteção de seus familiares por não suportarem a carga de exigências e a incompreensão daqueles que o deveriam apoiar e poderem ser verdadeiros no seu jeito de ser.
Mas isso está mudando. Temos nos organizado e buscado reconstruir nossa imagem e cada vez mais temos comprovado que a desconstrução de estereótipos, seja em palestras, em protestos, na mídia ou nas escolas se faz com informação de qualidade, clareza e coração aberto, o que não tem faltado aos nossos valentes militantes do interior das Minas Gerais.
Camisinha sempre! 

sábado, 8 de setembro de 2007

Minha família diferente – 08/09/2007



Nossa vida começa cedo. Ainda sonolento, preparo a cafeteira e logo o cafezinho quente dá um bom dia ao meu companheiro que desperta. A TV faz com que o louro José seja uma das raras testemunhas dessa intimidade matinal que mistura roupas de cama emaranhadas, lembranças desconexas e planos imediatos. Abrir as cortinas e deixar o sol entrar, abrir as janelas e renovar o ar significam recomeçar a viver. Saudar o dia com um bom dia!
Momentos tão efêmeros e tão inocentes. O despertar em família enche de significado esse poema chamado lar. O vapor do chuveiro, aroma de café, sabonetes e dentifrícios, cantaroladas soltas que permeiam os gestos cotidianos, autômatos, ensaiados durante anos de repetição.
Um beijo sela a partida para o trabalho e autentica o cumprimento da rotina. O beijo do dia. Presente nos cuidados, nas atenções, no comum à vida de todo mundo: dinheiro pouco, despesas muitas; tarefas chatas que se acumulam; pessoas chatas que se acumulam; problemas chatos que se acumulam.
O dia segue entre fatos e tarefas. No entorno, os que dão notícias, os que demandam atenção, aqueles que nos orgulham, que partem, que não se emendam. Tempo que vai passando, às vezes lento e brando, outras veloz e quente, na razão direta do prazer que o momento proporciona: muito prazer, tempo rápido; pouco prazer, tempo lento.
Compras para o jantar, um chocolate travesso, um reencontro gostoso, uma cerveja, um sorriso, um beijo… E o dia vai se rendendo à calma da noite, ao jornal na TV, a novela, o cafuné, o jantar. Sono, sonhos compartilhados, cortinas que se fecham para que o sol da manhã renove, amanhã, mais uma vez, o nosso dia-a-dia.
Recentemente, li a opinião de uma leitora num jornal de Juiz de Fora, que dizia que nós homossexuais não deveríamos ter o reconhecimento da nossa união, pois éramos uma afronta às famílias. Fiquei pensando nas famílias que estão aí e em que a minha afronta as outras.
Minha família "diferente" constrói relações baseadas no amor, se preocupa, compartilha sofrimentos, alegrias, vitórias e derrotas. Minha família se solidariza nas injustiças, elabora ideias, pactua, planeja, avança e recua e eu não vejo nisso nada de diferente ou afronta. O amor que nos une é tão público e tão íntimo como é o amor nas famílias tradicionais. Público, quando admirado no afeto; íntimo, quando comemorado no sexo. Sagrado e reservado o suficiente para garantir que permaneça e seja reconhecido como público e notório.
Minha família trabalha, consome, acata as leis, cumpre seus deveres e deveria ter seus direitos reconhecidos. Minha família participa da comunidade, se comove com a miséria, ajuda a educar. Vive nesse planeta e está atenta à destruição do meio ambiente. Ela se preocupa, recicla, preserva a natureza, bebe água, respira, vive.
Minha família se reserva o direito de manter sua privacidade e de definir, ela mesma, suas regras e tradições, seu jeito de ser, seu conceito de beleza, de sedução e amor, assim como defende a garantia desse direito a todas as outras. Somos nós que estabelecemos como educamos nossos filhos, quando os temos, o nosso comportamento público, nossa participação política. Isso faz parte do direito de todas as famílias.
É preciso que o senso comum seja questionado. Famílias de homossexuais são tão comuns como famílias de viúvos, ou famílias sem filhos, ou famílias de pais separados. São tão dignas quanto as outras e devem ser respeitadas em sua privacidade, suas dores e seus amores. Afronta é negar isso.
Camisinha sempre! 

sábado, 1 de setembro de 2007

O lado invisível da visibilidade – 01/09/2007


Visibilidade. É com esse argumento que a cada dia a sigla que se refere a nós muda, aumenta e se torna mais incompreensível. Ou será que temos a ilusão de imaginar que as pessoas comuns saibam na ponta da língua o que significa GLBTTT? Chegam a ser patéticas as discussões que tratam dessas siglas nos congressos e encontros que reúnem homossexuais. Aliás, a própria palavra homossexual já não contempla o universo das pessoas que possuem desejo pelo mesmo sexo.
Tudo começa com a premissa de que somos nós mesmos que definimos quem somos. Sou eu que digo que sou gay porque eu sei que meu desejo é dirigido a outros homens. Também aos heterossexuais, às lésbicas, aos bissexuais, travestis e transexuais é garantido o direito de se auto-identificar. Não somos nós que definimos a identidade do outro, senão ele próprio. Os sentimentos e as percepções que se passam na sua cabeça são o que permite definir seu papel, seu comportamento ou sua identidade.
Assim, travestis e transexuais femininas (homem para mulher) se identificam com o gênero feminino: usam roupas de mulher, nomes de mulher, têm aparência feminina (cabelos, seios, quadris, feições). Usam o provador feminino, o banheiro feminino e, além do preconceito por serem pessoas trans, sofrem por serem femininas num mundo machista. Algumas não se consideram homossexuais uma vez que se relacionam com pessoas masculinas, como as mulheres hetero. Portanto, não somos todos e todas homossexuais.
Até pouco tempo usávamos transgêneros (no sentido de transitar entre os gêneros – masculino e feminino) para identificar as travestis e transexuais. Entretanto, algumas não se consideravam contempladas e visíveis o suficiente uma vez que a referência aos dois grupos numa palavra só acaba por ocultar as particularidades que cada um deles possui. Exigiram, portanto, que fossem referenciadas separadamente. Outras discordam e se consideram realmente transgêneros, usufruindo da flexibilidade que o conceito lhes dá e preferem continuar a serem tratadas assim. Entre uma posição e outra, optou-se por adotar os três Ts: travestis, transexuais e transgêneros.
Definitivamente, não somos todos gays. No Brasil adotamos a palavra gay para definir os homens homossexuais, ao contrário dos países da Europa e Estados Unidos, onde a palavra se aplica tanto a mulheres quanto aos homens. Nossas mulheres fazem questão de serem tratadas como lésbicas e seu desejo deve ser respeitado. O L não pode ser esquecido.
Os bissexuais existem e não necessariamente são bígamos ou polígamos. Eles estão hetero ou homossexuais, dependendo do foco do seu desejo naquele momento de sua vida, mas não são nem uma coisa nem outra; são bissexuais, com características e demandas próprias. Eis a importância do B.
E, em nome da visibilidade, letras e mais letras vão sendo incorporadas a uma sigla que, a cada dia nos torna mais invisíveis pela própria incompreensão das pessoas do que diacho significa GLBTTT. Como se não bastasse, a ordem dessas letras também é motivo de polêmica. Lésbicas acham que o L deve vir primeiro; travestis acham que os bissexuais devem vir por último e o que antes era GLBTTT pode se tornar LGTTTB.
Em que o acréscimo de uma letra que ninguém sabe o que significa numa sigla que ninguém sabe o que quer dizer aumenta a visibilidade de um segmento? Que tempo estamos perdendo tentando emplacar um conceito que necessita de uma longa tradução a cada vez que é pronunciado! Como desperdiçamos energias e dificultamos a compreensão com tanto preciosismo e tanta celeuma!
Por trás disso tudo se esconde uma gigantesca discussão política que ofusca o que nos une. Novos parceiros se aproximam da luta pelo respeito à livre orientação sexual e precisamos ser mais claros e objetivos nos conceitos essenciais à nossa comunicação. E, definitivamente, GLBTTT, ou LGTTTB torna visível tão somente as letras G, L, B e T (três vezes). Isso não significa nada para milhares de pessoas que não sabem que estamos nos referindo a gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros. Quanto mais às suas diferenças.
Camisinha sempre!