sábado, 21 de maio de 2011
Marcha - 21/05/2011
Na manhã de quarta-feira, 18 de maio, um dia depois do Dia Mundial de Combate à Homofobia, o céu de Brasília parecia ainda mais alto, mais aberto, mais azul. Um dia lindo esperava a sacrificada militância LGBT na Esplanada dos Ministérios para a 2ª Marcha Nacional contra a Homofobia, convocada pela ABGLT. Ativistas engajados se propunham a marchar da Catedral Metropolitana até o Supremo Tribunal Federal, que receberia um abraço simbólico em agradecimento ao recente reconhecimento da união estável homossexual.
Gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais de todo os sotaques tomaram a principal avenida de Brasília para denunciar a homofobia, responsável por milhares de mortes de brasileiros e brasileiras, cujos assassinos encontram-se impunes. Os ônibus se sucediam e desembarcavam delegações entusiastas, ansiosas por agitarem suas bandeiras coloridas, distribuírem seus folhetos, bradarem seus slogans e aplaudirem seus aliados. Em comum, a defesa da aprovação do PLC 122, o midiático projeto de lei que criminaliza o preconceito contra os homossexuais.
A Marcha não é uma Parada Gay, mas não deixa de ter a nossa cara. Estavam lá as travestis e drag queens em figurinos extravagantes que atraem as lentes de fotógrafos e cinegrafistas ávidos por cores, performances e destaques. Acima do "close", as travestis tinham prontas suas palavras de ordem e exigiam a garantia de seus direitos. Elas não nos deixaram esquecer que estão sendo dizimadas pelos que insistem em não reconhecer seus direitos cidadãos.
Abriram a Marcha mães e pais de homossexuais, representando nossas famílias e lembrando o quanto a homofobia machuca não só os homossexuais. Ao microfone, revezavam autoridades, políticos, representantes de associações e órgãos públicos, sempre denunciando a interferência autoritária e retrógrada das religiões no Legislativo.
Na contramão dos passos da multidão que passava em frente ao Congresso, políticos evangélicos bradavam na tribuna que o PLC 122 havia naufragado e anunciavam um texto alternativo ao Projeto de Lei Complementar, desconsiderando nosso protagonismo e todo o seu processo de construção coletiva. Na verdade, o texto desagrada os religiosos por estabelecer limites ao discurso preconceituoso dos templos, que incita a violência contra os LGBTs.
Os religiosos não passam de uma fração mínima e barulhenta do Congresso Nacional. A grande maioria apoia a luta dos homossexuais e, segundo a senadora Marta Suplicy, o momento é propício para um avanço nos direitos LGBTs. Nas palavras do deputado gay Jean Wyllys, "está na hora da passagem do estágio da vergonha para o do orgulho".
sábado, 14 de maio de 2011
Vai casar? - 14/05/2011
Acredito que todos os homossexuais que tenham um namorado ouviram
essa pergunta pelo menos uma vez durante a semana: e aí, agora você vai casar?
Quando o tempo permitiu, a resposta se esticou para esclarecer as diferenças
entre união estável e casamento, relembrar um pouco o trâmite moroso e árduo
das propostas de legalização das uniões civis entre pessoas do mesmo sexo no
Legislativo, que se desenrola desde 1995 e outros aspectos que suscitam dúvidas
a partir da decisão do STF de considerar as uniões estáveis homossexuais como
núcleos familiares; quando o tempo era curto,
nos limitamos a exibir nossa alegria e compartilhar a felicidade de galgarmos
um importante degrau rumo à conquista da cidadania plena.
Hoje, nenhum casal
homossexual que registre sua união estável corre o risco de, no caso de morte
de um dos dois, ver o viúvo ser expulso de casa pela família do falecido, como
é tão comum. Uma criança adotada por um casal gay passa a ter direitos sobre o
patrimônio de seus dois pais ou mães, não somente de um deles, como acontecia
na adoção por solteiros.
Com a decisão do STF,
conquistamos um direito e não uma obrigação. Casais homossexuais também se
conhecem, se encantam, namoram e decidem ou não se casarem. Hoje, já podemos
optar por registrar ou não nossa união estável, mas não somos obrigados a
fazê-lo, caso não queiramos.
Casais homossexuais também
atravessam crises, momentos de insegurança e, juntos com o direito de registrar
nossas uniões estáveis, conquistamos o direito de rompê-las, arcando com as
consequências legais disso, como pagamento de pensão alimentícia,
responsabilidade sobre a educação e saúde dos filhos etc.
Os "casamentos"
que assistimos essa semana são, na verdade, o aproveitamento da oportunidade de
estarmos num cartório, diante de um tabelião, registrando uma união efetiva,
com testemunhas e assinaturas de um documento, para fazer disso uma celebração,
sem que na verdade signifique o casamento civil.
Os ganhos advindos da
decisão do STF são gigantescos, se considerarmos o nosso patamar anterior, onde
o máximo que conseguíamos era sermos reconhecidos como uma sociedade comercial,
o que se limitava a amenizar nossos problemas patrimoniais. Agora, somos reconhecidos
como uma família e passamos a garantir todos os mesmos direitos e deveres das
famílias heterossexuais em situação de uniões estáveis, mas não mudamos nosso
estado civil ou nosso sobrenome.
A decisão do STF,
infelizmente, não acaba com o preconceito contra os homossexuais. É um passo
importante, já que o Estado reconhece essas famílias e lhes dá legitimidade.
Mas, sem o PLC 122, que criminaliza a homofobia e determina punições para os
que discriminarem os LGBT, não se garante a segurança aqui fora dos armários.
sábado, 7 de maio de 2011
Casamento - 07/05/2011
Após a ressaca da goleada do movimento LGBT no Supremo Tribunal
Federal (STF), casais homossexuais de todo o país se perguntam o que muda em
suas vidas daqui para a frente. Afinal, como fica a minha vida com o Marquinho,
a do Michel com o André, do Ricardinho com o Rodrigo, do Tufveson com o Piva,
da Beth com a Karen, enfim, dos 60 mil casais homoafetivos que tiveram a
coragem de declarar suas famílias ao IBGE no Censo de 2010 e de outros tantos
que não o fizeram?
Apesar da importância do dia
5 de maio para os homossexuais brasileiros, na prática a vida não muda muito. O
documento que reconhece a união estável homoafetiva já pode ser conseguido em
cartórios de registro civil desde 2005. Problema maior sempre foi fazer com que
ele seja aceito e acatado em situações onde era preciso reconhecer nossas
uniões. Nosso plano de saúde, por exemplo, aceitou o registro; mas, não
conseguimos o mesmo com o clube recreativo. Isso não acontecerá mais.
Segundo Maria Berenice Dias,
um dos nomes mais referenciados durante o julgamento das ações no STF, o
registro de união estável não cria uma relação a partir dele e sim, reconhece
uma união já existente. Ele é uma declaração pública de duas pessoas que vivem
juntas e que se entendem uma família. A única diferença entre união estável e
casamento civil, é a inexistência da celebração, isto é, não existe a presença
do Juiz de paz para realizar a cerimônia.
Paradoxalmente, entretanto,
seguindo o artigo 226 da nossa constituição, quando o Estado reconhece uma
união estável, se obriga a "facilitar sua conversão em casamento", o
que nos indica a evolução efetiva na garantia dos direitos das relações
homoafetivas que é o casamento gay, conforme proposta recente do deputado Jean
Wyllys (PSOL-RJ), na Câmara Federal.
Apesar do enorme avanço
conquistado com a decisão do STF, permanece uma lacuna que faz com que a nossa
festa não seja completa: o reconhecimento da possibilidade do casamento entre
pessoas do mesmo sexo, tal qual entre pessoas de diferentes gêneros.
Maria Berenice vai além e
aventa a hipótese de um instrumento normativo que possibilite a reversão das
uniões estáveis em casamento. Segundo a ex desembargadora, isso seria
perfeitamente possível, agora que a limitação da lei às uniões entre homens e
mulheres acaba de cair por terra.
domingo, 1 de maio de 2011
Distância - 30/04/2011
O governo de Minas Gerais está cada vez mais distante dos
movimentos sociais. Enquanto outros Estados se adaptam aos novos contornos da
administração pública, que inclui o controle social autônomo e efetivo como
parte fundamental da construção de políticas públicas, assim como considera sua
participação no momento do voto, nosso Estado mantém-se à distância, com
dirigentes soberbos e alheios à necessidade de respostas às demandas da
sociedade.
Por aqui, depois de eleitos
ou nomeados, faz-se o que bem se quer, ignora-se as necessidades e os anseios
da população e promove-se uma administração completamente alienada da realidade
social. O governo se veste com a capa da autoridade e desconsidera projetos,
programas, compromissos. Vivemos ainda num sistema em que o papel dos gestores
públicos se resume à administração das relações com o governo federal e à
transferência de responsabilidades aos municípios, desde que amarrem
compromissos e comprometam votos nas próximas eleições.
Com o movimento LGBT, a
situação é vergonhosa, e o abismo que separa o governo e os homossexuais é, em
última instância, responsável pelo recrudescimento escandaloso dos índices de
assassinatos por homofobia e a destruição de uma rede compartilhada da qual se
esperava resultados efetivos, onde a sociedade civil cumpriria o papel de estar
onde o Estado não alcança.
O que vemos hoje é a
situação inversa. A recém-criada Coordenadoria Especial de Políticas da
Diversidade Sexual da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social, órgão
subordinado à Subsecretaria de Direitos Humanos que tem, entre suas
atribuições, o "apoio às ações e projetos da sociedade civil", o
"desenvolvimento de projetos especiais voltados para a redução da
vulnerabilidade social e da promoção humana", "a promoção da formação
de redes sociais e a realização de conferências relativas às políticas públicas
no âmbito da sua competência", não poderá cumpri-las sem que haja uma
participação ativa e uma interlocução efetiva com os movimentos sociais.
Nos últimos anos, os homossexuais
mineiros têm se deparado, cada vez mais, com barreiras intransponíveis ao
tentarem compartilhar a construção de uma política pública que busque a
emancipação da população LGBT no Estado. A manutenção desse distanciamento
crônico reforça a comodidade dos que cozinharam em banho-maria durante os
últimos anos um Centro de Referência LGBT ineficiente e sem nenhuma expressão e
confirma uma lamentável e equivocada estratégia de se ignorar a triste
realidade dessa camada da população mineira.
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