sábado, 28 de junho de 2008

Evolução – 28/06/2008



O conservadorismo impera nos gabinetes, plenários e corredores do Congresso Nacional. Câmara e Senado estão dominados por uma cultura machista, autoritária, preconceituosa e, a bem da verdade, chata.

Ali, convivem em harmonia séculos de dominação e poder que só às custas de muita luta darão lugar ao desconforto do novo, do moderno, apesar da adrenalina do desafio. Mudanças provocam progresso, mas também alternância de poder e, nesse caso, as celebridades de hoje podem, amanhã, verem-se obrigadas a uma vida de cidadãos comuns, vítimas das leis que ali produzem e carentes dos direitos que seus privilégios os fazem esquecer.

O Congresso está repleto de pessoas que adotam a arrogância como código de comportamento: o não-arrogante não se impõe nesse mundo de varões onde, vira e mexe sai pancadaria. Coisa de machos.

A hipocrisia cresce na mesma proporção que evoluem os costumes. Cada direito que se conquista, cada reconhecimento, cada grupo que alcança sua cidadania pode representar uma ameaça à manutenção do poder daqueles que estão por ali, protegendo seu osso e garantindo que as regras não mudem e nem a zona de conforto que se encontram: dinheiro fácil, trabalho pouco, fama e poder.

Mas a evolução independe deles. Costumes mudam, grupos se organizam, a sociedade impõe suas necessidades e o puritanismo se torna ridículo. Eles precisam fazer do pensamento conservador, o dominante. E que os eleitores se conveçam de que tudo deve permanecer como está. Mas, não conseguem. Um costume só muda quando a maioria da população adota nova maneira de agir, de dar valor. Essa maioria inclui os próprios conservadores, mesmo contra os ditames de seus líderes.

Em recente pesquisa realizada pelo DataSenado, ficou comprovado que 70% dos 1.122 entrevistados aprovam a criminalização da homofobia, proposta pelo PLC 122/06, tramitando no Senado. Ao contrário dos discursos aguerridos que ouvimos na TV, Congresso e nos templos, 55% dos evangélicos e mais de 70% de outras religiões estão a favor do projeto.

Em nome de quem, senão de si próprios, estão falando os fundamentalistas religiosos que inundam nossas casas legislativas? Não existe a tão falada unidade de pensamento entre os evangélicos e seus companheiros de crença. É preciso considerar isso nas próximas eleições.


Camisinha sempre!

sábado, 21 de junho de 2008

Vergonha! – 21/06/2008




Quando a Lei Municipal 9.791 foi aprovada na Câmara de Juiz de Fora, em maio de 2000, a notícia ganhou o mundo. Pela primeira vez uma legislação que punia atos de discriminação contra os homossexuais explicitava a permissão de troca de afeto entre pessoas do mesmo sexo em locais públicos. A imprensa, interessada em alardear o fato e fazer disso um escândalo, anunciou: "Liberou geral!". E os conservadores, orientados pelo pensamento popular fácil e impactante, espalhavam que a partir daquele dia os gays estariam fazendo sexo nas mesas dos restaurantes da cidade.

Uma senhora chegou a escrever para os jornais dizendo sentir-se envergonhada de sua terra natal, quando, em suas viagens, ouvia referências a Juiz de Fora como "cidade de veados". Bem, até eu, que sou gay, não gostaria de ver minha cidade sendo tratada de forma tão pejorativa. Mas, o tempo viria a negar o rótulo preconceituoso. Ela se tornou conhecida como uma cidade de vanguarda, pioneira na garantia de respeito aos cidadãos, inclusive os homossexuais. Sempre nos orgulhamos quando ouvíamos nossas conquistas ligadas à forma como a cidade se tornara conhecida e o quanto as pessoas se referiam a isso com admiração.

Castigo. Hoje, estamos assistindo Juiz de Fora ser manchete dos jornais de todo o Brasil de outra forma: a cidade onde o prefeito garanhão rouba, aceita propinas, se deixa filmar recebendo sacos de dinheiro e combinando dividir comissões com outros tão desonestos quanto ele. O homem escolhido pelo voto dos cidadãos da Manchester Mineira não se preocupou sequer um instante conosco, que moramos aqui, com a nossa qualidade de vida. Castigou seu eleitorado, privou a cidade de benfeitorias esbanjando o fruto da sua desonestidade em benefício próprio, ostensivamente, afrontosamente. O heterossexual Alberto Bejani envergonha Juiz de Fora no Brasil inteiro.

Ironicamente, foi sua a voz mais contundente contra a nossa Lei Rosa. Esse mesmo político esteve à frente de todo o movimento que tentou revogá-la com o argumento de que ela envergonhava nossa cidade. Derrotado no embate político, viu-se obrigado a engolir a legalidade dos casais de namorados passeando livremente pela cidade, desfrutando o direito garantido a todos, em igualdade de condições, independente de sua orientação sexual. Curvou-se à constatação de que a Lei Rosa se tornara um dos motivos de projeção positiva da cidade em todo o país e isso, ao contrário, sempre foi motivo de aplausos.

Agora, infelizmente, temos motivos concretos para nos envergonhar de alguma coisa em Juiz de Fora.


Camisinha sempre!

sábado, 14 de junho de 2008

Stonewall – 14/06/2008



Nunca pensei que pudesse ser assim. Normalmente, apesar de bastante tocado pela emoção, lugares bonitos ou marcantes me deixam feliz, mas não me recordo de ter me emocionado tanto, nem quando conheci outros lugares famosos do mundo. Mas, quando desci do metro na Cristopher Street, em Manhattan, e virei a direita, uma sensação diferente tomou conta de mim.

Ainda não eram 9h quando tudo isso aconteceu e, claro, todo o comércio daquela região estava fechado, mas as bandeiras com as cores do arco íris estavam ali, indicando que não havia errado o caminho. Caminhei alguns quarteirões e, de repente, estava diante do famoso Stonewall Inn, um charmoso bar da cidade de Nova York, cenário do nascimento do movimento gay em todo o mundo, 39 anos atrás.
Fiquei ali parado, estático, emocionado, procurando o melhor ângulo, imaginando tudo que havia lido a respeito sobre aquele 28 de junho de 1969, quando gays, lésbicas e travestis se confrontaram com a polícia norte-americana, acostumada a humilhar e extorquir os donos dos bares gays nessa cidade. Pequeno, sem nenhum atrativo maior, estampa seu nome manuscrito num letreiro em néon vermelho, na vitrine que fora destruída pelos policiais durante o confronto, agora recuperada. Só depois me dei conta que, exatamente em frente, numa agradável pracinha ainda fechada aquela hora (Stonewall Place), um grupo de trabalhadores da prefeitura limpava as quatro estátuas que representam dois casais de gays e lésbicas em homenagem ao ocorrido.
Fiquei caminhando pelas redondezas ate as 14h, quando o bar abriu e pude sentir a atmosfera do lugar, por dentro. Tree, o proprietário de 69 anos, memória viva dos acontecimentos, me recebeu com carinho e quando disse que era brasileiro, se derreteu. Ele visita o Rio de Janeiro anualmente, durante o Carnaval, fala alguma coisa de português e não se furtou a responder as minhas perguntas em detalhes.
Sem aviso, a polícia chegou e decidiu identificar os freqüentadores do bar. Prenderam duas travestis, mas deixaram o cadeado do camburão destrancado. Um grupo, então, soltou as duas e os policiais reagiram agredindo um transexual de bigode, lembrou. A partir dai, os gritos de "Gay power" e "We want freedon" tomou as ruas, os jornais e o mundo. Foram 12 presos naquele dia, entre eles o cantor Dave Van Ronk, que passava por ali.
Tudo isso é muito recente e ainda está vivo na memória daquelas pessoas. Enquanto conversávamos, outros clientes gays e lésbicas se aproximaram para ouvir a história e sentir o mesmo orgulho que todos nos comemoramos, no mundo inteiro, no dia 28 de junho.

Camisinha sempre!

sábado, 7 de junho de 2008

Lula é S – 07/06/2008


GLS: gays, lésbicas e simpatizantes. Por menos que pareça, ser simpatizante também exige coragem. Se por um lado a cultura homofóbica ainda cultiva o ditado "diga-me com quem andas e te direi quem és", por outro existem pessoas que não se preocupam com isso. Felizmente.
Corajoso, o presidente Lula esteve no meio de nós durante a solenidade de abertura da 1ª Conferência Nacional de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais, falou conosco, olhou nos nossos olhos e cravou na história um dos mais significativos fatos do nosso movimento. Isso mesmo: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve presente na abertura da Conferência, em Brasília, cercado por ilustríssimos ministros e secretários e secretárias de estado; deu-nos as boas-vindas, se comprometeu a colocar em prática as propostas geradas nesses três dias de trabalho e se disse honrado de ser o primeiro presidente do planeta a convocar uma conferência para tratar de políticas públicas para a população GLBT.
A noite do dia 05 de junho de 2008 foi realmente muito emocionante. Começou com o Ministro Paulo Vanucci, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos que brilhou: "A homofobia é incompatível com a democracia", lembrando que nenhum cidadão brasileiro será obrigado a usar um triângulo rosa para identificar sua orientação sexual – e ser discriminado, como fomos durante o holocausto nazista. O lugar do cidadão gay brasileiro é no Brasil, gozando dos direitos que todos possuímos.
Depois vieram as falas da sociedade civil, disputadíssimas, que ficaram sob a responsabilidade de um gay, uma lésbica e uma travesti. Levantaram aplausos e conquistaram a simpatia da mesa e dos presentes.
Fernanda Benvenutti, travesti sergipana, membro da Associação Nacional de Travestis, denunciou a verdadeira chacina que vem acometendo o segmento no Brasil. Lembrou que por trás dessa iniciativa do governo passaram-se muito desrespeito, humilhações e mortes que precisam ser detidas a qualquer custo.
Toni Reis, presidente da ABGLT – Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais, sempre bem humorado, mas visivelmente emocionado, quebrou o gelo, o protocolo e tratou intimamente o casal presidencial por Lula e Mariza. Deixou claro o que esperamos dessa Conferência e levantou a platéia em coro: "Nem menos, nem mais: direitos iguais!".
Mas, o presidente Lula conseguiu roubar a cena. Repetiu sua autodefinição metamorfósica ambulante e lamentou a ausência de um número maior de parlamentares naquele momento: "Com certeza, olhariam para vocês com cara de espanto e constatariam: são iguais a gente." Recebeu um boné e uma bandeira do arco-íris e não se intimidou em deixar-se fotografar exibindo as nossas cores.
Foi um começo digno de registro. O presidente, com certeza é "S".
Camisinha sempre!