sábado, 27 de outubro de 2007

O silêncio de quem financia – 27/10/2007



Agora é a vez das ONG. Entrincheiradas em meio a uma tumultuada disputa político-partidária, organizações não governamentais estão sendo acusadas de vertedouro do dinheiro público e instrumentos de desvio de recursos para bolsos particulares.

A figura jurídica ONG não existe. Na verdade, as chamadas organizações não governamentais são associações ou fundações voltadas para um objetivo. Fundações são constituídas a partir de um patrimônio colocado à disposição da defesa de uma causa; associações são erguidas a partir do interesse de várias pessoas na promoção de valores, conquista de direitos, mudança de comportamento, etc. São chamadas não governamentais porque independem do governo e complementam suas ações. É assim com as ONG que defendem o meio ambiente, a fauna e a flora, os idosos, crianças e adolescentes, mulheres, negros, homossexuais; que promovem o turismo, que acolhem desabrigados, que assistem feridos de guerra, etc. etc., etc.

ONG não substitui o estado. Não desobriga o estado de incluir os excluídos, acolher os necessitados e garantir o direito à dignidade e oportunidades de progresso. ONG são novas frentes que se somam aos esforços governamentais para acelerar o processo de conquistas e redução das desigualdades. O Terceiro Setor, que engloba todo o conjunto dessas organizações sem fins lucrativos – que hoje movimentam mais de US$ 1 trilhão por ano no mundo; cerca de US$ 10 bilhões deles no Brasil – é responsável pelo tão falado “controle social” que tanto tem acelerado o processo de consolidação democrática no nosso país.

O Terceiro Setor, porém, não sobrevive sem os outros dois, uma vez que é financiado pelo Primeiro (as três esferas do poder público) ou pelo Segundo (a iniciativa privada), cada um deles com seus interesses específicos.

O estado se vale das ONG para alcançar diretamente a população. São as ONG que detém a proximidade com segmentos de difícil acesso, como por exemplo os grupos vulneráveis às DST-Aids, como as profissionais do sexo, os usuários de drogas e os homossexuais. Assim, não é raro encontrar ONG que sobrevivem com recursos governamentais, via financiamento de projetos que incluem os “invisíveis” e garantem seu acesso ás políticas públicas.

O Segundo Setor – a iniciativa privada – se vale das ONG como forma de enriquecer o seu balanço social, conquistar simpatia para seus produtos e amenizar as desigualdades na distribuição dos lucros advindos das suas atividades mercantis. É através dos recursos repassados pela iniciativa privada que grande parte dessas associações sem fins lucrativos consegue cumprir seus objetivos estatutários.

Diferente das iniciativas governamentais de financiamento de projetos, cujas regras são publicadas em editais abertos para esse fim e cujos proponentes devem comprovar sua capacidade de executar tarefas e alcançar os objetivos propostos, a iniciativa privada elege seus beneficiários baseadas em critérios relacionados ao mercado que atua, aos males que causa à natureza, à insalubridade a que submete seus empregados ou a comunidade em que se insere, ou mesmo com base no altruísmo de empresários sensíveis a determinadas bandeiras. Causas polêmicas ou que não sejam unânimes são caixas de marimbondo sempre descartadas.

Os convênios estabelecidos entre governo e ONG são regidos pelas mesmas regras que regem os repasses de recursos para estados e municípios e a legislação possui tal nível de exigência que tem feito com que a gestão dessas organizações demande uma estrutura de controle e prestação de contas muitas vezes maior do que a própria estrutura voltada para sua causa central. Mesmo assim, não são raros os casos de ONG obrigadas a devolver recursos de projetos por má administração e descumprimento das regras unilaterais estabelecidas nos contratos.

No meu entender, portanto está existindo uma inversão de valores quando todas as ONG são colocadas como as vilãs, no mesmo barco que aquelas ligadas a políticos corruptos que se valem de brechas na legislação ou de artifícios desonestos para auferir vantagens pessoais, e que acabam desacreditando todo um trabalho sério e responsável que vem beneficiando milhões de brasileiros.

Até agora não ouvimos uma voz sequer dos órgãos governamentais financiadores, em defesa de seus convênios e da lisura com que estabelecem suas parcerias. Não ouvimos uma voz sequer de nenhuma esfera governamental indignada com a generalização que vem levantado suspeitas sobre todos os convênios firmados entre órgãos de governo e ONG desse país. Com a palavra os financiadores governamentais.

Camisinha sempre!

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