sábado, 26 de maio de 2007

Paradas do Orgulho 2007 – 26/05/2007


Dia 10 de junho inicia-se oficialmente a temporada de Paradas do Orgulho GLBT em nosso país. Começando pela maior do mundo, a de São Paulo que, no ano passado mobilizou perto de 2 milhões de pessoas, embaladas por mais de 20 trios elétricos, entre eles o já famoso trio Gay de Minas, organizado pelo MGM.
Ainda pouco compreendidas, as paradas compõem o repertório clássico de manifestações de rua que passam pelas mais diversas estratégias e características próprias.
No Brasil, tudo começa no Carnaval. Em fevereiro/março, os foliões tomam as ruas para festejar o reinado de Momo, e ocupam as cidades com batucadas e o canto alegre de quem precisa extravasar suas angústias acumuladas durante o ano inteiro. Três dias de folia "para tudo se acabar na quarta-feira…"
Logo depois, nossas ruas são tomadas pelas procissões católicas da Semana Santa. Enfileirados, portando velas acesas, fiéis de terços e véus e se deslocam atrás de seus santos, conduzindo- os com seus cânticos religiosos, desfilando sua fé pelas cidades, entre orações e louvores.
Em setembro, é a vez dos militares desfilarem seu poder pelas ruas. Marchando em cadência, perfilados em harmonia, representantes das forças militares comemoram a data da Independência do Brasil sob o ritmo das bandas marciais, hinos oficiais, bandeiras e uniformes.
Eventualmente, outros grupos tomam as ruas. Passeatas de protestos, greves e reivindicações são comuns, organizadas conforme o seu próprio código. Palavras de ordem, carros de sons, faixas, panfletos e discursos calorosos, bandeiras partidárias, sindicais, panelas e apitos compõem o cenário das passeatas que tanto influenciam os grandes momentos da história do Brasil.
As Paradas do Orgulho GLBT também possuem o seu jeito próprio. A primeira parada do mundo aconteceu num domingo em Nova York, em 28 de junho de 1970. A March on Stonewall ou Stonewall Riots marcava o primeiro ano dos conflitos ocorridos no Bar Stonewall Inn, que em 1969 havia sido palco de uma verdadeira batalha por direitos entre homossexuais e a polícia norte-americana.
No ano seguinte ao conflito, cerca de 15 mil homossexuais se concentraram em Greenwich Village e marcharam até o Central Park, iniciando a construção de um movimento de reivindicação e garantia de direitos humanos da população GLBT que se espalharia por todo mundo.
No Brasil, as paradas do orgulho adquiriram um desenho próprio e expandiram-se a ponto de termos hoje, em São Paulo, a maior Parada GLBT do mundo, reunindo 2 milhões de pessoas na capital paulista, em 2006.
Em 2006, no Brasil, foram realizadas 112 paradas nos mais distantes municípios, mobilizando próximo de 5 milhões de pessoas em todas elas.
A segunda maior parada brasileira está no Rio de Janeiro (500.000 pessoas) e a maior parada de todo o interior do Brasil acontece em Juiz de Fora, MG, reunindo 100 mil pessoas em 2006.
A ideia de que as paradas são um "Carnaval fora de época" realmente só serve para reproduzir a falsa imagem de que os homossexuais não são sérios. Entender a nossa forma de manifestação cívica como uma algazarra pública é negar a diversidade e impor um padrão à multiplicidade cultural do nosso país.
O simples fato de nos mostrarmos como cidadãos homossexuais, nas ruas, sob a luz do sol, de manifestarmos nosso afeto em público, de exibirmos toda nossa irreverência e alegria já cumpre um dos principais objetivos das paradas: o maior movimento nacional de visibilidade massiva se propõe a tirar do gueto e dos armários sufocantes uma população que tradicionalmente se esconde para ser aceita; se nega para sobreviver num mundo que insiste em nos negar.
Participe das paradas. Vista sua roupa de domingo e vá para as ruas. Se você é homossexual, liberte-se e mostre a sua cara. Se você não é, apóie e sinta como é interessante um mundo desprovido de preconceitos.
Camisinha sempre!

sábado, 19 de maio de 2007

Todo gay é… – 19/05/2007


Com frequência sou convidado a falar sobre homossexualidade em escolas, universidades, associações, e costumo começar perguntando se conhecem ou têm algum amigo gay. São poucos os que dizem sim. Geralmente as mulheres, ou os alunos homossexuais que afirmam seu si", felizes pela rara oportunidade de ouvirem sua sexualidade sendo abordada ali, na sala de aula, no seu ambiente. É sempre um prazer identificá-los. As pessoas em geral conversam pouco sobre a homossexualidade.
Raras são as famílias que abordam o tema de uma forma educativa, séria e inclusiva, sem termos pejorativos ou estereótipos. Se você não é homossexual, não tem amigos ou parentes ou pessoas homossexuais no seu círculo de relacionamento, esse assunto raramente entra em pauta.
A importância de se dar visibilidade ao tema homossexualidade, de uma forma respeitosa, inclusiva, responde à quebra de um ciclo que reproduz os preconceitos e que precisa ser interrompido.
As poucas informações que circulam vêm da mídia ou do lugar comum que, na nossa sociedade, significa informações repletas de homofobia. É importante que circule o outro lado da moeda, o lado cidadão, o ponto de vista da diversidade para fazer frente a tudo que aprendemos de errado.
E as pessoas vão achando que "todo gay é…" Como eu escuto isso! Revela uma visão dos gays como um grupo homogêneo, o que, definitivamente não somos. Importa saber, além disso, que visão é essa. E, normalmente, é aí que mora o problema:
"Todo gay é um homem que não deu certo". Precisamos entender que todo gay é homem que tem desejo homossexual, mas continua sendo homem. São poucos os que revelam ter vontade de ser mulher. Esses, geralmente possuem uma identidade de gênero diferente do seu sexo de nascimento. São as travestis ou as transexuais.
"Todo gay é promíscuo". Gays não reagem diferente de heterossexuais às provocações eróticas que nos rodeiam. Fotos, filmes, roupas provocantes, corpos expostos provocam nos gays exatamente as mesmas reações que provocam nos heteros. Mais em uns homens, menos em outros, independente de sua orientação sexual. Gays são educados no mesmo ambiente que os homens heterossexuais e possuem os mesmos limites. Mas, não são todos iguais, claro.
"Todo gay é escandaloso". Alguns são escandalosos. Outros tímidos a ponto de se enrubescerem. Alguns reagem escandalosamente aos olhares discriminatórios, numa forma de agressão reativa. Outros se fecham e se escondem. Exatamente como os heterossexuais. Diga-se de passagem, nem todo gay é covarde, e nem todo gay é ruim de briga, ou de bola se é que isso referencie algum homem.
"Todo gay é jeitoso". Ou é cabeleireiro, decorador, envolvido de alguma forma com moda ou profissões que estejam mais ligadas ao universo feminino (existe isso?). Realmente, não temos como negar que as mulheres temem menos os gays que os homens. O nível de homofobia entre as mulheres é bem menor e o universo feminino nos recebe melhor. Mas existem gays completamente desajeitados e incapazes de pentear seu próprio cabelo, assim como existem os gays médicos, advogados, pedreiros, pintores, lixeiros, metalúrgicos, motoristas…
"Todo gay é inconveniente". Não é difícil entender que homens heterossexuais são objetos de desejo não só das mulheres, mas também dos gays. E homens tomam a iniciativa. Heteros abordam as mulheres; gays, os homens, sejam gays ou heteros. Homens heteros precisam parar de se ofender com a abordagem de um gay. Ninguém tem sua orientação sexual estampada no rosto. Nada mais civilizado que reagir a uma cantada entendendo-a como um elogio. Imagine se fosse natural reagir sempre com um soco. Todos os homens estariam apanhando, independente de sua orientação sexual.
"Todo gay é engraçado". Alguns de nós são mesmo bastante engraçados. A maioria porém, não tem muitos motivos para rir ou ser engraçada. Não dá para generalizar.
"Todo gay é inteligente" ou "todo gay é burro". Nem santo, nem demônio. Homossexuais estão tão sujeitos aos erros do nosso sistema educacional, à falta de acesso às informações, aos parcos recursos que os possibilitem desenvolver seu potencial intelectual como qualquer outro cidadão brasileiro.
"Todo gay é doente de Aids". Quanta gente ainda pensa assim! Quantos heteros ainda se expõem ao vírus, às práticas sexuais desprotegidas por acreditarem que Aids é doença de gay. Quanta gente está se infectando, infectando seus parceiros, por não entender que, se a Aids foi detectada primeiro entre os gays, não significa que ela é uma doença dos gays. Ela é uma doença da humanidade com toda a sua diversidade e todos estamos expostos a ela.
Existem gays doentes de Aids, existem heteros doentes de Aids. E existe a camisinha que é o único jeito de nos protegermos e a quem amamos.
Camisinha sempre!

sábado, 12 de maio de 2007

Mãe, eu sou gay! – 12/05/2007


Mãe, eu sou gay!
Todos concordam: o alívio compensa a dor e o nervosismo de um dos momentos mais tensos na vida de qualquer homossexual: a hora de se revelar para a família, em especial para ela. Como é difícil dizer: “Mãe, eu sou gay!”.
Aliás, não é fácil dizer isso a ninguém. Geralmente recebemos um ato de violência em resposta à revelação da nossa homossexualidade. É comum uma risadinha, uma chacota, uma baixa no tratamento que passamos a receber a partir daí, seja feita à família, aos colegas de escola, trabalho ou os amigos de rua. Isso quando não acontece a violência física homofóbica, propriamente dita: “sai fora, viado!”. Portanto, revelar-se homossexual sempre é uma situação tensa e temida por grande parte dos gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais. Bem diferente dos heterossexuais.
Não me esqueço da minha revelação à minha mãe. Já adulto, vivia uma temporada de retorno ao lar materno, o bom e velho ninho de Santa Tereza, em BH. Eu e minha mãe sempre nos admiramos e apoiamos muito. Tínhamos uma relação franca, mas ironicamente, as últimas pessoas a quem revelei minha homossexualidade foram justamente as que eu mais amava; minha mãe entre elas.
Época conflituosa, nervosa, estressante, em que minha vida dupla era repleta de constantes sobressaltos. Sempre existia um folheto de um bar gay esquecido no bolso de uma calça; ou uma janela qualquer largada aberta no computador, telefonemas suspeitos, destinos obscuros, histórias mal contadas, companhia estranhas. O submundo de farsas e mentiras que acaba envolvendo quem vive no armário insistia em emergir. As evidências escapavam pelos meus dedos, incapazes de conter o incontido.
A decisão de me abrir com a minha mãe já estava tomada. Há meses vinha me preparando para isso. Aquele conflito que me matava por dentro já não fazia mais sentido para um adulto, senhor de seus próprios passos. Mas, a oportunidade, o momento certo não surgia.
Um final de tarde rotineiro, ao chegar do trabalho, encontro minha mãe recebendo umas senhoras, amigas, na sala de casa. Minha presença foi saudada com carinho e minha mãe me apresentou ao grupo, descerrando meu curriculum, ao que as amigas concordavam, compartilhando o orgulho da D. Marlene – é como ela se chama.
E eu ali, ao lado da mãe-coruja, com o tradicional sorriso próprio a essas situações, seguindo o sábio conselho: “quando estiverem te elogiando, não interrompa”. Ainda mais quando os elogios partem da sua mãe.
No dia seguinte, meus conflitos voltaram a me incomodar forte. Essa divisão entre o possível e o verdadeiro me pressionava tanto que joga meu humor lá embaixo. De repente, interrompo minha mãe de seus afazeres e revelo: “Mãe, eu sou gay!”.
Seu rosto não escondeu suas preocupações. Séria, controlando aquela tempestade interior, ouviu até o fim o que eu dizia e chorosa, meio sem palavras, repetiu o bordão de grande parte das mães, nesse momento: “onde foi que eu errei?”
Foi nesse momento que eu lembrei a ela o dia anterior. Porque o orgulho que ela demonstrava ontem deveria dar lugar à vergonha de hoje? Minha homossexualidade não podia ser tão fundamental assim, a ponto de superar negativamente todas aquelas virtudes que no dia anterior eram os adjetivos que me credenciavam.
E disse: “Mãe, você nunca errou. Em nada. Ser homossexual não significa que algo saiu errado. Ser homossexual significa apenas um jeito de amar diferente, mas acima de tudo uma capacidade de amar. Pior seria se eu estivesse me revelado uma pessoa violenta, incapaz de estabelecer uma relação afetiva ou um homofóbico que reage às diferenças com agressões.
“Talvez mude um pouco os rumos do destino que você desenhou para mim. Em vez de uma nora, um genro nos almoços de domingo. Porém, a base de tudo, a noção de família que você me ensinou continua sendo o fundamento da família diferente que eu construí: respeito, amor, solidariedade.
“Você não errou em nada. Você, e todas as mães de homossexuais, acertaram quando criaram filhos e filhas valentes, que desafiam toda a ordem machista estabelecida e colocam sua coragem na defesa de sua forma de amor, sua coerência, sua dignidade.”
Camisinha sempre!

sábado, 5 de maio de 2007

O Papa não é bem-vindo para todos – 05/05/2007




Bento XVI desembarca no Brasil quarta-feira, dia 9 de maio. Anunciada desde setembro de 2006, sua vinda é esperada com ansiedade pela mídia e pelos católicos, mobilizando um estupendo aparato de marketing que insiste em impor uma adoração a esse papa estranho, carente de carisma, longe do povo, distante da necessidade de renovação que as religiões, de uma forma geral, clamam.
Algumas posições das Igrejas já não atendem mais os anseios de seus fiéis. Pais católicos estão cansados de condenarem e assistirem a condenação de seus filhos homossexuais pela Igreja. Estão cansados de viver em conflito quando usam ou recomendam o uso da camisinha a seus filhos e filhas. Estão revoltados por serem colocados na posição de pecadores por encontrarem seu grande amor num seu segundo casamento. Tem faltado uma posição progressista às religiões que proponha sua adequação às novas necessidades da vida moderna.
Talvez por minha formação católica, sempre entendi como obrigação dos seres humanos fazer o melhor uso possível das dádivas que receberam nessa vida, seus talentos, usando-os para a promoção do bem coletivo e o progresso de todos. Nesse sentido, sempre espero daqueles que possuem o dom da liderança, aqueles que falam para multidões e possuem o poder do convencimento, uma atitude de avanço, de idéias novas, de transformações que promova o fim das injustiças e preconceitos.
Talvez por isso, nunca me convenci do discurso conservador e obediente do padre Marcelo, por exemplo, presença constante na mídia, figura pública, adorado, seguido por multidões, mas que nunca trouxe nada de novo, nunca defendeu sequer suas posições pessoais e jamais propôs avanços significativos na instituição a que pertence.
O que dirá o papa.
Entendo que não podemos tratar a Igreja como um bloco homogêneo, mas as vozes daqueles que são as forças progressistas nas religiões estão caladas.
Reconheço que existem os aliados, aqueles que distribuem camisinha, mesmo contra a vontade da cúpula da igreja; que abençoam a segunda união de seus fiéis, mesmo contra seus superiores; que apóiam ou são homossexuais e estão no quadro das igrejas sofrendo todo tipo de privação de seus desejos em nome de uma vocação, ou se rebelando, vivendo seus desejos homoafetivos e homoeróticos nas sombras, sem segurança, sob os olhares embaçados de seus bispos ou suas paróquias.
Mas esses aliados estão parados. Não se nota nenhum tipo de pressão para reverter a posição da sua Igreja.
Tímido, talvez temendo enfrentar esses aliados-calados, o movimento GLBT não conseguiu sensibilizar-se em torno de uma grande mobilização nacional que demonstrasse sua insatisfação com as posições conservadoras e adversárias do Papa, por ocasião de sua visita ao Brasil. Existe uma grande preocupação em não ofender, em não conquistar a antipatia da grande maioria da população brasileira e, principalmente, do grande número de católicos- amigos-progressistas que pertencem à igreja, mas que sempre estão do nosso lado nas lutas contra a AIDS, contra as injustiças sociais, pelo meio ambiente, pelo direito a terra, etc.
Os amigos, entretanto, não podem nos calar. As posições do Vaticano e seu chefe têm legitimado, senão autorizado e incentivado a violência contra os homossexuais  a homofobia. A Igreja persiste em combater e negar o direito das mulheres sobre seus corpos e o poder de decisão sobre a interrupção de uma gravidez não desejada. Insiste em condenar o uso do preservativo e acaba dificultando o enfrentamento de uma epidemia que cresce a cada dia, principalmente entre os jovens, vitimando também seu rebanho de fiéis.
Nossos amigos progressistas católicos, a quem o movimento teme ofender, não têm se sentido ofendidos quando o chefe de sua igreja nos ataca e nega os nossos direitos.
Bento XVI nos desrespeita, promove a condenação dos homossexuais e nos coloca na condição de anormais, subcidadãos a quem se julga no direito de tutelar, indicando o que é certo ou errado para nós. Bento XVI condena o nosso amor.
E quando manifestarmos nossa indignação com isso, não estaremos desrespeitando seu líder ou seus valores. Com certeza nossos aliados saberão entender e apoiar nossa indignação manifesta.
Camisinha sempre!