Desde a semana passada mais de 80 mil pessoas estão nas ruas para mais uma contagem da população brasileira. A novidade é que o IBGE acrescentou em seus questionários uma pergunta que pode revelar o número de casais homossexuais que dividem o mesmo teto no Brasil.
Essa reivindicação é antiga. Em 2000, o Grupo Gay da Bahia já insistia na necessidade de se fazer um levantamento da real população de homossexuais no país.
Não tão real assim, convenhamos, uma vez que uma parcela significativa dos homossexuais ainda não se sente à vontade o suficiente para assumir publicamente sua orientação sexual.
Qualquer dado que venha a ser apurado pelo IBGE deixará dúvidas de sua veracidade, com certeza. Há décadas utilizamos o “Relatório Kinsey” como base para dimensionar a população de homossexuais, sempre que esse dado se faz necessário.
Albert Kinsey realizou um grande estudo sobre sexualidade no final da década de 1940 e chegou ao percentual de 10% de homossexuais no mundo. O estudo sempre foi criticado e vários são os argumentos que o desmerecem, até mesmo o desequilíbrio populacional provocado pelo pós-guerra.
Mais recentemente, em 2004, o Programa Nacional de DST-Aids do Ministério da Saúde divulgou uma pesquisa de conhecimento, atitudes e práticas sexuais na população brasileira com idade entre 15 e 54 anos, em que 3,5% dos homens entrevistados revelaram manter relações sexuais com outros homens.
Foram 6.000 questionários aplicados, em todos os Estados brasileiros, o que nos dá uma outra dimensão da população de gays masculinos no Brasil.
O número não deixa de carregar as dúvidas que sempre giram em torno dessas pesquisas, uma vez que o medo e o preconceito são sempre fatores que colocam em dúvida quaisquer tentativas de se dimensionar uma população acostumada a se ocultar para sobreviver.
Enquanto a militância GLBT comemora o novo questionário do IBGE e espera ansiosa pelos resultados, o instituto revela que não está buscando apurar o número de homossexuais brasileiros e, sim, depurar um dado que poderia levar a erros nos relatórios finais, uma vez que a metodologia anterior oferecia somente a opção “cônjuge”.
Passa agora a perguntar o sexo desse cônjuge e nos dar uma pista do número de casais homossexuais. Bem, nem tanto. A contagem que agora está sendo feita somente se dará em municípios com população abaixo de 170 mil habitantes que, somados, chegam a um pouco mais da metade da população brasileira.
A outra metade vive nos grandes centros urbanos. Ou seja, estarão sendo pesquisadas cidades pequenas, onde a homofobia é muito maior, onde casais homossexuais são raros e onde assumir- se é ainda mais difícil.
Outro ponto que pode mascarar os resultados da pesquisa, além das respostas não verdadeiras, é que são muitos os casais de homossexuais que não dividem o mesmo teto.
Esses simplesmente passarão despercebidos pelo censo. Entretanto, uma coisa deve ficar clara independentemente de nos surprendermos com resultados altos ou baixos revelados por essa contagem: não é o número de homossexuais que fundamenta a necessidade de ações afirmativas a favor dessa população, no Brasil ou em qualquer parte do mundo.
Direitos humanos devem ser garantidos a todos, sejam brancos, negros, homens, mulheres, homo ou heterossexuais, muitos ou poucos. Fosse somente um cidadão gay na face da Terra, mesmo assim seus direitos teriam que ser garantidos e seria responsabilidade do Estado promover o combate à homofobia.
E o Estado brasileiro tem caminhado nesse sentido. Nesta semana mais um ministério, agora o do Trabalho e Emprego, acenou com a possibilidade de cumprir os compromissos assumidos no Programa Brasil sem Homofobia.
O ministro Carlos Lupi recebeu o presidente da ABGLT – Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros –, declarou seu apoio à aprovação do projeto de criminalização da homofobia que tramita no Senado e se comprometeu a criar um grupo de trabalho que coloque em prática as ações previstas de combate à homofobia afetas ao seu ministério.
Extremamente aguardadas, essas ações colocarão o dedo na ferida de um dos segmentos em que a homofobia impera e causa mais prejuízo à população homossexual brasileira: a iniciativa privada.
Caso não sejam colocadas em prática as ações previstas, continuaremos à margem do mercado, desempregados e vítimas do machismo que domina as relações de trabalho e emprego.
Camisinha sempre!