sábado, 18 de dezembro de 2010

Gay de Minas - 18/12/2010


E de repente, surge no meio da avenida Paulista um enorme trio elétrico vermelho, onde cerca de 40 gays agitavam bandeiras do arco-íris. Na frente do trio, uma foto do rosto belíssimo da rainha do Rainbow Fest de 2005, a travesti Julia Branco, envolvida em plumas de pavão sob o título "Gay de Minas" e a marca do MGM. Éramos um dos mais de 20 trios elétricos que se alinhavam para a 9ª Parada do Orgulho LGBT de São Paulo. 

Nosso orgulho era múltiplo: estávamos ajudando a construir a maior parada gay do mundo, trazíamos o MGM para o evento de forma magistral, com seus militantes, um caráter político vigoroso e uma alegria de dar gosto. Além disso, divulgávamos o nome de Juiz de Fora para todo o país, como a primeira cidade mineira a reconhecer os nossos direitos, através de uma lei que nos protegia e um movimento gay forte e vitorioso. 

E os paulistas reconheciam isso. Ao ler as faixas e perceber que aquele era um trio elétrico dos gays de Minas Gerais, a população aplaudia e acenava positivamente. Os bombados-sem-camisa do chão se encantavam com os rapazes mineiros em cima do trio e com o som contagiante dos dois DJs juiz-foranos e seu repertório perfeito para aquele momento: Coldhans e o estreante Jeff Valle, hoje um dos mais requisitados DJs da cena gay nacional. 

E a fórmula deu certo. O mix de militância, beleza, simpatia e música de qualidade arrastou e manteve no entorno do trio "Gay de Minas" uma multidão de seguidores desejosos de conhecer o sucesso do Rainbow Fest. Grande parte dessas "barbies" ajudaria a construir uma relação de fidelidade entre os gays musculosos e o evento mineiro, famoso pela beleza de seus rapazes. 

Enquanto desfilávamos, o diretor do MGM, Michel Brucce, com seu olhar criterioso, encarregava-se de "selecionar" os convidados a subirem no gigantesco carro de som. Os rapazes sarados e a força de nossa mensagem atraíam a atenção de jornalistas curiosos por conhecer os gays de Minas que se organizaram para estar ali. 

A cena se repetiu por alguns anos, e a participação do trio "Gay de Minas" nas paradas de outras cidades, como Rio, Belo Horizonte e São Paulo, ajudou a construir uma imagem positiva dos gays mineiros: uma turma alegre, cheia de garra e competência para conduzir uma luta que nos garanta direitos e respeito. 

Camisinha sempre! 

sábado, 11 de dezembro de 2010

Trans - 11/12/2010



Recentemente, o Prof. Luiz Mott, antropólogo fundador do Grupo Gay da Bahia e pedra fundamental do movimento gay brasileiro, divulgou sua iniciativa de fazer um levantamento das travestis e transexuais brasileiras que de alguma forma se destacaram no cenário nacional. Começou pela academia, relacionando as bacharéis, mestres e doutoras que conseguiram vencer a barreira dos muros universitários e hoje compartilham espaços profissionais qualificados com suas colegas heterossexuais, numa relação de igualdade rara para as pessoas trans, ainda vítimas de enorme preconceito.

Entre elas, para citar algumas, Jaqueline Cortes, Maitê Schneider e a saudosa advogada cearense Janaina Dutra, uma das nossas grandes perdas em decorrência da Aids. Seguramente, outras dezenas ficaram de fora da lista, o que não tira o mérito da iniciativa e nem fecha a possibilidade de sua atualização constante.

Foi a partir daí que me lembrei daquelas travestis e transexuais que fazem parte do meu círculo de amigas e com as quais aprendi um pouco sobre os conflitos de gênero que enfrentam e as soluções que encontraram para conseguir sobreviver na nossa cultura transfóbica.

Chris dos Brilhos, por exemplo, saiu da roça, de Senador Cortes, interior de Minas, para ser a primeira transexual mineira a ter documentos civis com seu nome social reconhecido. Extremamente religiosa, faz parte do grupo de orações de sua paróquia, ao lado de outras tantas senhoras rezadeiras. Chris foi pioneira também entre as que já realizaram sua readequação sexual e conta com orgulho as histórias de sua cirurgia transgenitalizadora no Equador, há muito tempo.

Ou Baby Mancini, uma das mais belas travestis brasileiras. Baby, além de ser proprietária de um salão de beleza em Juiz de Fora, esteve à frente do Concurso Miss Brasil Gay durante vários anos. Destaque no Carnaval, na Parada Gay, está sempre envolvida com as badalações da alta sociedade e é nossa leitora assídua. Uma travesti que conquistou respeito e um espaço que vai além das fronteiras de Minas e se estende por todo o país.

Nem Chris e nem Baby brilharam nos bancos das universidades, mas nunca deixaram de lutar pelos seus direitos. Souberam fazer de sua aparência uma bandeira e de cada chegada um instante de reflexão: sobre o lugar de cada um, sobre direitos individuais, sobre ser autêntico.

Camisinha sempre!



sábado, 4 de dezembro de 2010

Assédio - 04/12/2010




Recentemente, surpreendi-me aqui com dois comentários de um senhor que se diz não homofóbico. Ele justifica sua complacência: tem parentes gays e até um irmão "gente muito fina" que morreu em consequência da Aids.

Chama a atenção o destaque que ele dá aos parentes, como se o fato de tê-los estivesse automaticamente relacionado com um comportamento não preconceituoso. Eu também tenho vários parentes homofóbicos, sr. Paulo, e nem por isso concordo com eles.

Mas o que mais me surpreendeu foi a relação que ele estabelece entre os gays e ele, como homem. Esse leitor comenta que, não raramente, era paquerado por homossexuais. Gays que o assediavam, que tentavam iniciar uma conversa, que o achavam atraente e que recebiam em troca uma resposta ríspida e sua indignação violenta. Seus netos passam por situações semelhantes e, ao contrário dele, que partia para a agressão e "descia o braço", têm medo de nós.

Em momento algum passou pela cabeça desse senhor que ele e seus netos foram desejados pelos homossexuais que os assediaram e que as "cantadas mis" que receberam estavam relacionadas com a atração que eles, possivelmente bonitos e interessantes, despertam nos homens que gostam de homens.

Esse senhor heterossexual jamais parou para pensar quantas vezes ele abordou uma moça bonita "enquanto ela parava para ler uma notícia numa banca de jornal" porque essa moça era seu objeto de desejo e dali poderia surgir um namoro, uma amizade ou um envolvimento passageiro.

Ao contrário das moças, ele simplesmente "descia o braço" nos homens que se interessavam, que se aproximavam, que se sentiam atraídos por ele.

Sr. Paulo, como tantos, nunca pensou em responder ao assédio de um gay educadamente e entendê-lo como um elogio. Se um homossexual se aproximava, ele, cheio de razão, respondia com violência.

Depois de tantos anos, ele ainda considera que as agressões homofóbicas noticiadas recentemente em São Paulo poderiam ser evitadas se os gays não se interessassem pelos heterossexuais como ele. Ou seja, se os gays não fossem gays.

E, pior, não percebeu que a educação que seus netos estão recebendo é a mesma dos agressores paulistas, que reproduz a homofobia e o desrespeito às diferenças.

Camisinha sempre!