Assustada, a menininha se detém diante da descoberta de uma aranha que
tece sua teia no canto do banheiro e grita em pânico: "Mãe, tem um bicho
aqui!". De lá, a mãe pergunta preocupada: "Que bicho, Beatriz?".
Sem saber do que se trata, a pequena responde com segurança: "Acho que é um
macaco!".
O Natal para nós sempre teve uma importância ímpar. A maior de todas as
nossas celebrações era o orgulho da família musical que se reunia para tocar e
cantar. Mas, bem antes da noite de 24 de dezembro, já compartilhávamos o que
seria a nossa festa, aquela em que tudo fugia à rotina e os limites do dia a
dia eram ultrapassados com permissão. Naquela noite feliz podíamos ficar
acordados até mais tarde, esperando as 12 badaladas, quando cantávamos o
"Noite Feliz" e fazíamos uma deliciosa troca de presentes, entre
sorrisos de gratidão e surpresas.
Em dezembro, minha mãe montava o presépio: em torno da gruta central
feita de um papel que imitava rocha, onde ficava a Sagrada Família, dezenas de
personagens se espalhavam pelo cenário que ocupava um canto estratégico da sala
de visitas. Coisas curiosas e encantadoras enchiam nossos olhos infantis, como
o lago feito com um caco de espelho onde nadavam miniaturas de patinhos, o
pastor que carregava um carneirinho nas costas, rodeado por bichinhos de pé,
sentados, deitados na grama feita de serragem verde. Uma estrela-guia prateada,
um galo no alto da colina, musgos, conchinhas de praia, areia e sapólio davam
realidade à vila em miniatura, que ficaria em exposição até 6 de janeiro,
quando os Reis Magos finalmente encontravam o Menino Jesus recém nascido.
Nós, as crianças, participávamos de todo o processo de construção
daquela fantasia e nos deixávamos dominar pelo clima de expectativa docemente
cultivado pelos adultos.
As casinhas do presépio talvez tenham sido mais importantes na nossa
vida do que imaginemos. Pelo menos para um de nós. Depois de anos cultivando a
sensibilidade do olhar observador e aprendendo a ver beleza nas construções
simples e singelas de Belo Horizonte, do interior de Minas, de roças e
povoados, Beatriz Leite hoje é uma artista plástica que se dedica a contar a
nossa história através de miniaturas de algumas casas que guardam especial
significado para famílias interessadas em perpetuar a lembrança de seus lares.
É essa mulher a menina que um dia confundiu uma aranha de banheiro com
um macaco, a artista que hoje nos dá um exemplo de vida e envia seu convite de
formatura onde se lê: "‘A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí
afrouxa, sossega e depois desinqueta. O que ela quer da gente é coragem -
Guimarães Rosa".
Camisinha sempre!
Maiores detalhes sobre o trabalho de Betariz Leite em http://www.familialeite.net/beleite/
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigado por deixar seu comentario.