sábado, 10 de março de 2007

O legado dos gays - 10/03/2007


Os primeiros casos de Aids no Brasil surgiram em 1980. Ninguém sabia direito que doença era aquela, mas desde 1977, 1978, notícias tristes chegavam dos Estados Unidos sobre um câncer que estaria atacando o sistema imunológico das pessoas, fazendo com que doenças geralmente fracas o suficiente para serem combatidas pelo próprio organismo se tornassem problemas letais.

Prato cheio para a homofobia, os preconceituosos se apegaram ao fato da doença ter sido detectada inicialmente na comunidade homossexual como a peça que faltava para que o quebra-cabeça da condenação se completasse: a Aids foi taxada de castigo divino aos gays e seus hábitos sexuais promíscuos.

Interessante é que a doença não foi detectada somente em homossexuais masculinos. Na mesma ocasião, heterossexuais, principalmente os hemofílicos, também foram atacados pelo HIV, via transfusões ou mesmo relações sexuais desprotegidas.

Mas os conservadores já haviam se apoderado e não largariam fácil a idéia de que a Aids era o resultado da desobediência dos homossexuais à moral heterossexista dominante, o legado dos gays à humanidade, a "peste gay", motivo mais que suficiente para trancá-los definitivamente no armário.
Na verdade, a história é diferente. Vista por um outro ângulo, a humanidade tem uma dívida com os homossexuais.

Sabe-se hoje com segurança que a Aids não é doença dos gays, mas foram exatamente os estudos desenvolvidos conosco, a partir da observação dos nossos hábitos e estilo de vida, que revelaram informações básicas e cruciais sobre Aids que dispomos hoje.

É claro que o fato de a epidemia ter sido detectada em um determinado grupo restrito facilitou seus estudos e a tomada de decisões que viriam a controlá-la em todo o mundo.

Se os números hoje assustam, poderiam ter sido muito piores. Foi a partir dos homossexuais que se constatou, por exemplo, que a Aids era transmitida por via sexual. Foi da mobilização dos homossexuais que surgiu uma das mais honestas e eficientes formas de prevenção que é o conceito de sexo seguro.

Ele tem na camisinha sua principal sustentação, mas se estende a práticas sexuais criativas, prazenteiras e, principalmente, seguras.

Os homossexuais são os que melhor respondem às campanhas de prevenção e os dados epidemiológicos revelam que, apesar de alta, a incidência do HIV entre os gays permanece estável há vários anos.

Foram os homossexuais que se organizaram, até mesmo por uma questão de sobrevida, para pressionar governos e órgãos responsáveis pela saúde pública a agirem em relação à epidemia da Aids.

Testes, medicamentos gratuitos, campanhas de informação e distribuição de insumos de prevenção, até mesmo o Programa Nacional de DST-AIDS do Ministério da Saúde nasceram da pressão de um movimento nacional de luta contra a AIDS, criado a partir de iniciativas dos gays.

Esse sim é o grande legado que os homossexuais deixam para a humanidade, em relação à Aids. Mas a história não pára por aí. Em 1996, cientistas constataram que misteriosamente determinados homens homossexuais caucasianos eram portadores de uma mutação genética que oferece proteção natural contra o HIV.

A partir de vários estudos, ficou esclarecido que o HIV começa a causar problema quando se conecta a um receptor na superfície dos glóbulos brancos do sangue. Como se fosse uma chave na fechadura.
A multinacional farmacêutica Pfizer anuncia que ainda esse ano estará fabricando um novo medicamento contra o HIV baseado nesses estudos.

A nova droga se conecta a esses receptores antes do vírus HIV, não dando chance a ele de se plugar e iniciar seus efeitos nocivos. Ironia do destino. É exatamente entre os gays que pode estar surgindo a cura da Aids. 

Camisinha sempre!

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