O mundo sempre nos oferece lugares onde recarregar energias. Um deles é a nossa terra, onde reencontramos parentes, amigos e velhos desconhecidos, ao cruzar caminhos antigos com jeito de novos. Rever Belo Horizonte foi como encontrar minha casa reformada: onde antes era um ribeirão, hoje é uma avenida; onde antes os mendigos dormiam e o lixo imperava, uma praça de verdade; onde evitava passar, passeei, passeei… Fiz coisas comuns que todo mundo faz: assistir novela na sala da casa de mãe, ou tomar café da manhã ao som de programas no rádio.
Claro, não pude deixar de notar o mundo gay
fora do armário, invadindo os espaços e conquistando as atenções de todos. Ou
pelo bem; ou pelo mal.
Enquanto a chuva insiste em umedecer a
capital mineira, as salas de teatro se tornam uma ótima opção de férias.
Lotadas, oferecem espetáculos de teatro e dança a R$8,00, na 33ª Campanha de
Popularização do Teatro e Dança, evento patrocinado por grandes empresas, com o
apoio das Leis de Incentivo a Cultura, Federal, Estadual e Municipal.
Nós estávamos lá. Pelo menos quatro
espetáculos oferecidos tinham a temática GLS. Todos comédias; tristes comédias.
Em exibição homossexuais descontrolados, histéricos e insatisfeitos. Em nenhum
deles, a menor tentativa de se desconstruir estereótipos. Pelo contrário,
espetáculos toscos, incapazes de nos fazer rir a não ser ridicularizando o
outro, o diferente. Todos politicamente incorretíssimos.
O desrespeito não se limita aos
homossexuais, mas se estende aos negros, aos portadores de deficiência, idosos,
mulheres. E a platéia dos teatros lotados ri. Ri muito. Ri da loura burra, do
negão ladrão, do aleijadinho presidente, do velho brocha ou da bicha louca.
Foram ali para se divertir e se divertem com o mundo-cão do preconceito. Saem
dali com seu repertório renovado, experts em piadinhas machistas, homofóbicas,
racistas.
Não se tocam que riram o tempo todo do
desrespeito. Não riram de piadas, riram de pessoas. Não riram de prazer, mas de
nervoso. Não relaxaram com tiradas inteligentes e engraçadas, mas riram tensos
por estarem ouvindo coisas ofensivas, ditas no escracho, na lata, na tora.
Coisas que ofendem, que agridem. Coisas que retratam o grau de intolerância que
ainda permeia a nossa sociedade. No Brasil, somente no mês de janeiro desse
ano, pelo menos oito homossexuais foram assassinados por homofobia, segundo
levantamentos do Prof. Luiz Mott. Riram disso…
O Ministério da Cultura, um dos poucos a
assumir e promover ações previstas no Programa Brasil sem Homofobia, do Governo
Federal; o Governo de MG, que possui em
sua estrutura um Centro de Referência para Gays, Lésbicas, Bissexuais,
Transexuais, Travestis e Transgêneros; a Prefeitura de Belo Horizonte, o
Sindicato dos Produtores de Artes Cênicas de Minas Gerais e as várias e
significativas empresas patrocinadoras do evento deveriam ser mais criteriosos
ao elegerem os espetáculos que apóiam. Não faz sentido incluírem em suas
promoções textos teatrais que não ajudam a construir nada, reforçam
preconceitos e ridicularizam pessoas.
Espetáculos preconceituosos não deveriam
merecer o apoio dos mineiros, ainda mais o patrocínio de seus empresários, suas
instituições, seu governo. Autores precisam buscar alternativas mais inteligentes
e menos homofóbicas para seus enredos. Produtores precisam saber que textos
politicamente incorretos não conseguirão apoio para suas montagens. Atores
precisam estar atentos ao que lhes pedem para dizer e os atores homossexuais –
ou homossexuais atores – que não se prestem a isso, pois é patético assistir no
palco o triste espetáculo da homofobia internalizada.
Camisinha sempre!
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